quarta-feira, 19 de julho de 2017

Caboclo Urubatão da Guia



O Caboclo Urubatão da Guia bateu no peito e saudou a toda assistência que se encontrava no local.
Abaixou-se no chão para traçar alguns pontos riscados, levantou-se e começou sua prédica dizendo:
- Saravá filhados meus ! Tupã que abençoe e proteja o caminhar de cada um de suncês!!!
- Palavra de Caboclo no dia de hoje é muito curta, mas é importante que seja dita.
- Caboclo hoje vai falar sobre aquilo que suncês chamam de injustiça,mas que Caboclo chama da Lei de ação e reação.
A assistência estranhou a comparação, mas o Sr. Urubatão continuou:                
- Quando um filhado é alvo de magia negativa suncês chamam de que?
- Injustiça!!!
- Quando um filhado fica muito tempo desempregado suncês chamam de que?
- Injustiça!
- Quando um filhado passa por insucessos nos relacionamentos amorosos, os filhados dizem que é o que?
- Injustiça!
- Só que esses exemplos que Caboclo deu, entre muitos possíveis, não são injustiça; suncês sabem por quê?
A assistência sinalizou negativamente e a entidade, então, disse:
- Por que injustiça não existe! Tudo que existe é a justiça de Deus!
A assistência remexeu-se nos bancos demonstrando perplexidade com a informação.
- Tupã é justo ou injusto?
- Justo!
- Sua criação é justa ou injusta?
- Justa!
- Tupã espera que suncês andem no mundo de forma justa! Que se relacionem com o próximo de forma justa, que se relacionem com o dinheiro de forma justa, enfim que sejam justos com tudo e com todos, pois só a justiça leva ao equilíbrio.
- Urubatão não fala do equilíbrio na balança não, mas do equilíbrio que leva a paz interior e ao bem agir.
Uma senhora de óculos e de aparência bem simpática levantou a mão e pediu a palavra:
- Sr. Caboclo, escuto tudo que está dizendo, mas como o Sr. explicaria alguém que procurou levar sua vida de maneira correta, mas que passou toda vida sem sorte no amor?
- Ação e reação, filhada! Suncês não estão passando pela primeira encarnação. Quem poderá afirmar, com cem por cento de certeza, que suas encarnações pretéritas tenham sido pautadas pela mesma conduta justa que suncê esclarece desenvolver na atual existência corpórea?  
- No grande Livro da vida Tupã tem registrado o caminhar de todos suncês neste mundo de terra. Onde há necessidade de reparação Tupã sabe e oportuniza tal possibilidade a cada encarnação.
- Tudo aquilo que suncê, filhada, chama de falta de sorte no amor, Caboclo chama de oportunidade de resgate cármico. Se suncê tiver humildade, resignação e entendimento de que tal experiência não é para seu mal, mas para seu crescimento espiritual, então terá aprendido a amar a Deus acima de todas as coisas, de qualquer circunstância e, talvez, quem sabe não tenha também a chance de experienciar de Sua misericórdia nesta área de sua vida? Porque o amor, filhada, cobre uma multidão de pecados!
- Além disto, filha, se suncê continuar procurando conviver com o próximo e consigo mesma de forma justa, estará semeando condições de colher uma próxima encarnação de grandes possibilidades para sua evolução espiritual.
Outra pessoa da assistência ergueu a mão solicitando consentimento para falar:
- Mas se os casos de magia negra não são uma injustiça, como é que são tratados no terreiro? O tratamento destes casos não seria uma forma de reparação da injustiça cuja vítima destas práticas estaria sofrendo?
- Filhado, todos os casos de magia negra que este Cabloco conhece começam, invariavelmente, da seguinte forma: os filhados sentem necessidade de obterem alguma coisa que, naquele momento, não são merecedores de alcançar.
- O tempo passa e como não alcançam aquilo que julgam ter direito de receber, passam a desenvolver internamente pensamentos de desamor, revolta, melancolia e descrença de que foram criados por Deus para serem felizes em toda sua plenitude. Tal atitude íntima faz com que atraiam psíquica e eletromagneticamente para sua aura e centros de força miasmas, bacilos e larvas astrais.
- A reverberação de tais sentimentos e pensamentos no campo íntimo cria condições ideais para a aproximação de espíritos descompromissados com a ética do Cristo. Pronto! Criada está a oportunidade para que seja vitimizado por uma magia negativa, uma vez que se apresenta psíquica, energética e eletromagneticamente sem suas defesas.  
- Quando uma pessoa que está magiada é tratada no terreiro, não se trata de caso de reparação da injustiça, mas de tratamento e trabalho para que ocorra a reforma íntima do outrora magiado.
- O que Caboclo quer dizer é que o magiado não é um injustiçado, uma vez que ele mesmo criou as condições para ser vitimado pela magia negra.
- Toda vez que Caboclo, com a permissão de Tupã, termina o desmanche de uma magia negra ele, seguindo o exemplo de Jesus, diz para o outrora magiado: “ Vá e não peques mais! “
- Tupã, filhados, a cada dia oferece condições para suncês serem felizes, mesmo que não sejam àquelas que, muitas vezes, suncês desejam.
- Revoltar-se contra os desígnios do Pai para a vida de suncês, isto sim é que Caboclo vê como uma grande injustiça!
- Procurem se apegar com Deus a cada dia de suas vidas meus filhados! Procurem honrar a vida que Ele deu a suncês!  Procurem enfim, como disse um grande sábio, “desenvolver coragem para modificar as coisas que podem ser mudadas, serenidade para aceitar àquelas que não podem ser modificadas e sabedoria para distinguirem umas das outras”.
- Tenham fé filhados!!! Procurem esperar em Deus!!!
Outra pessoa da assistência levantou a destra e disse:
- O Senhor que me desculpe, Sr. Caboclo, mas minha situação de desemprego não pode mais esperar!
- Esperar em Deus não é ficar num canto, sentado e esperando o emprego!
- Mas eu sei disto Sr. Caboclo!!! Já espalhei currículo para tudo quanto e lugar e, até agora, nada.
- Filhado, no Livro sagrado está escrito: “ Ganharás o pão com o suor do teu rosto! “ O que isto significa para suncê?
- Que devo para trabalhar para o meu sustento!
- No Livro sagrado especifica qual tipo de trabalho que deve ser realizado para obtenção do pão de cada dia?
- Não. Até mesmo porque qualquer trabalho é trabalho!
- Então por que suncê está esperando um trabalho específico para começar a trabalhar?
- É que acabei de me formar depois de anos e gostaria de enriquecer meu currículo!!!
- Mas será que no momento é isto que Tupã espera de suncê? Será que, no momento isto é de seu merecimento?
- Não saberia dizer!
- Será que suncê, ao dizer que “qualquer trabalho é trabalho”, não estaria sinalizando que não quer qualquer trabalho, mas O trabalho? O trabalho dos seus sonhos?
- Por que o Senhor diz isto?
- Por que para Tupã nenhum trabalho é qualquer! Todo trabalho e todo trabalhador tem o mesmo valor aos olhos do Pai! Caboclo sente em seu íntimo que o trabalho que não for da sua área de formação, então para suncê é qualquer! Não que para suncê não tenha valor, apenas não tem o mesmo valor daquele que suncê almeja! Se não fosse assim suncê diria “ todo trabalho é trabalho”, ao invés de “qualquer trabalho é trabalho”. Reflita sobre isto filhado!
- Que Tupã abençoe e proteja cada um de suncês! Que o manto de sua justiça possa aquecer o coração de suncês com muito amor, paz, humildade, resignação e sabedoria, fazendo com que sejam derretidas todas as más tendências que vem limitando o olhar de suncês para o tamanho da misericórdia de Tupã-Nosso-Pai!

- Tupã que ilumine o caminhar e o coração de cada um de suncês!!!!  

terça-feira, 14 de março de 2017

O carma, a caridade e o bem maior


Isabel caminhava em direção a Pai José. Ela estava prestes a comunicar-lhe sua decisão: pediria afastamento do terreiro.
- Boa noite zifia! Como vai suncê?
- Boa noite Pai José! O Senhor já sabe o que vim fazer aqui hoje, não sabe?
- Filha se este nêgo véio tivesse este poder ele não seria Pai José, mas sim o próprio Deus, pois só Ele sabe de todas as coisas.
- Como assim vovô?
- Nós não somos advinhos zifia! Se suncê veio aqui é por que tem algo a dizer e este nêgo tá aqui, de coração aberto, só para te escutar!
- Então acho que tenho que dizer de uma vez só, não é vovô?
- Da forma que for melhor pra suncê.
- É que eu vou pedir desligamento do terreiro. O que o senhor acha disto?
- Zifia toda decisão indica um caminho que é sinalizado por pensamentos e sentimentos. Onde este caminho vai dar, abaixo de Zambi, só teu pensar e sentir que poderão lhe dizer.
- Como assim Pai José?
- Bom senso minha filha! Toda decisão, de todo ser humano, deve ser pautada pelo bom senso.
- O senhor está dizendo que esta minha decisão não está baseada no bom senso?
- De forma alguma! Nêgo véio não faz julgamento de valor! Só estou explicando para a filha que a ilusão obscurece o bom senso.
- Ilusão? Como assim?
- Só um instantinho minha filha.
A entidade pediu que seu cambone trouxesse um copo de água em temperatura ambiente e outro de água gelada. Somente quando ele voltou foi que a entidade disse a Isabel:
- Zifia estique sua mão direita e diga se este líquido está quente ou frio.
O preto-velho derramou um pouco de água em temperatura ambiente na mão dela que respondeu-lhe:
- Nem quente, nem fria: está em temperatura ambiente.
- Continue com a mão estendida.
Pai José derramou a água gelada, que seu cambone trouxera, na destra de sua consulente que falou-lhe:
- Este líquido está gelado!
- Permaneça com sua mão esticada!
O preto-velho tornou a derramar água em temperatura ambiente na mão de Isabel, que disse:
- Esta água parece quente.
- Suncê viu de onde nêgo tirou esta água que suncê falou que parece quente?
- Vi sim senhor. Foi do copo com água em temperatura ambiente!
- E como a mesma água que antes suncê respondeu que estava em temperatura ambiente, de repente pareceu quente?
- É que a água que o senhor derramou na minha mão antes desta estava muito gelada.
- Muito bem zifia! Suncê é muito sabida! Percebe o que a ilusão dos sentidos pode fazer com seu julgamento? Seu pensamento? Seu sentimento?
- Não totalmente!
- Não se preocupe minha filha! Continue a prosear com este véio que Deus, em sua infinita misericórdia, há de fazê-la entender certas coisas.
- Vovô eu não consigo mais ver sentido em ficar aqui: o senhor sabe que minha filha, que assim como eu era médium desta casa, acabou de desencarnar fulminantemente por conta de uma enfermidade que ninguém pôde diagnosticar a tempo de salvá-la!
- Salvá-la de que, zifia?
- Do que? Da morte!
- Mas não existe morte zifia: só existe vida, ainda que em outro plano da existência!
- Nenhuma entidade contou nada para mim ou para ela, que só foi saber da doença quando passou mal e os médicos a diagnosticaram como enferma, após realização de vários exames.
- Suncê se sentiu traída por nós, minha filha?
- Vocês sabiam da doença?
- Era visível a nóis, pelo perispírito!
- Então devo dizer que me senti traída, pois vocês não me alertaram.
- Nóis passamos um tratamento para a zifia!
- Sim e ela o seguiu, mas foi um tratamento que o senhor sabia que não resolveria o problema dela, que não a ajudaria. Vocês não nos alertaram!
- Zifia, e de que adiantaria nosso alerta se a doença começara a se desenvolver em sua filha há dez meses? Se a situação da saúde de sua filha era irreversível há cinco meses e se suncês entraram para a corrente mediúnica do terreiro há três meses?
- Mas vocês poderiam ter nos alertado, nos preparado!
- Preparar? Desculpe a franqueza zifia, mas a preparação para a verdade imutável que é o desencarne deve acontecer todo dia e a todo o momento, e isto não é pensar negativo, mas sim com humildade e sabedoria, pois só Deus sabe a hora de cada um.
- Eu vou sair porque acho que vocês poderiam ter nos preparado!
- Filha há muito tempo, quando suncê tinha dezesseis anos, seu pai faleceu da mesma moléstia que sua filha apresentou!
- É verdade!
- Seu pai lutou contra a moléstia por quase treze meses.
- Isto também é verdade!
- E foi justamente durante estes treze meses que suncê, somatizando todo o sofrimento pela condição de saúde de seu paizinho, desenvolveu uma úlcera gástrica que tanto lhe incomoda até os dias de hoje.
- É verdade.
- Agora minha filha, abrindo seu coração com honestidade, responda:
- Em que lhe ajudou saber sobre a doença de seu pai?
- Acho que começo a entender o senhor.
- Zifia Isabel este nêgo véio fala a suncê que nóis, que suncês chamam de entidades, não somos advinhos!
- Somos falangeiros que militam pela Lei maior e pela Justiça divina! Para Deus a caridade que se faz a um de Seus filhos é uma caridade feita para toda a humanidade!
- Entendo.
- Deus tem amor enorme por cada uma de suas criaturas, só que para Deus o bem maior está acima das individualidades e foi por isto que ao mundo Ele enviou Jesus.
Isabel chorou copiosamente, ao lembrar-se do sofrimento a que Jesus fora submetido quando encarnado, e reconheceu que o sofrimento de sua filha nada fora em comparação ao dele.
Pai José esperou o estado emocional dela tornar a normalidade e disse-lhe:
- Nêgo véio gostou da sinceridade do seu coração, mas aqui no dia de hoje nóis não estamos trabalhando o sofrimento de sua filha; até mesmo por que ela não sofre mais onde se encontra, já que está disposta em repouso em uma câmara de vitalidade aguardando o despertar em momento oportuno!
- Verdade?
- Sim zifia! No dia de hoje trabalhamos o seu sofrimento!
- É vovô! Cada um com seu carma!
- Filha, carma não é sofrimento, é libertação!!!
- Como assim?
- Carma, zifia Isabel,é ter humildade de clamar sabedoria a Deus diante dos desafios que são apresentados na vida de cada um, pois uma vez aprendido o ensinamento, com fé, humildade e resignação, evolui-se em direção a Deus-Nosso-Pai.
- Como assim?
- Na vida existe o carma não para nos causar sofrimentos, mas para possibilitar libertação, que é possível de acontecer, se tivermos sabedoria para vencer os desafios no caminho.
- Creio que entendi. A morte de um ente querido é um desafio natural da existência humana. O carma não é sofrer com a perda, uma vez que o sofrimento é natural nestes casos, mas sim alcançar a liberdade incondicional ao vencermos tal desafio.
- Zifia, tempos atrás suncê contou que a entidade que lhe assiste nas incorporações, o Caboclo Araribóia, apareceu duas vezes em sonho pra suncê e pedia que suncê continuasse a andar na estrada, não é verdade?
- Isto vovô! Ele aparecia e me mostrava uma estrada em que eu devia voltar a caminhar!
- Pois então zifia saiba que tal estrada não é necessariamente este terreiro, mas sim a Umbanda sagrada.
- Verdade?
- Certamente zifia, se suncê quiser sair do terreiro as portas vão estar abertas assim como se encontravam quando suncê por elas neste terreiro adentrou pela primeira vez. O importante na sua vida não é o terreiro zifia, o importante é a Umbanda!
- Isto é verdade mesmo Pai José por que, antes de eu entrar neste terreiro há três meses, fiquei cinco anos afastada da Umbanda!
- Nêgo véio entede zifia! Foi quando seu esposo faleceu, não foi?
- Foi isto mesmo vovô!
- Após vinte e cinco anos de casados o seu esposo faleceu de câncer e suncê, como forma de homenagear o amor que sempre houve entre suncês, decidiu prestar trabalho voluntário em alas de hospitais onde estão internadas crianças que possuem câncer, não é verdade?
- Como o senhor sabe disto vovô? Eu nunca contei para ninguém?!?
- Foi o Caboclo Araribóia zifia!
- Ah é? Por que vovô?
- Por que para Deus o bem maior tá acima das individualidades.
- Como assim? O senhor poderia explicar?
- Filha o câncer em sua família não é sofrimento, é carma! Possibilidade de libertação em direção a Deus.
- Isto eu entendo.
- Carma é cumprimento da Lei maior e da Justiça divina na vida de seus humanos filhos! Quando estes se envolvem consistentemente em trabalhos caritativos, o Pai envia sua misericórdia como um bálsamo em suas vidas.
- Entendo.
- O teu trabalho voluntário em favor das criancinhas fez com que suncê recebesse a oportunidade de ter a sua filha tratada e assistida pelos médicos do astral para que viesse a ter um desencarne sereno e indolor!
- Meu Deus, eu jamais poderia imaginar! Ela realmente nada sofreu!
- Estou autorizado a dizer mais a suncê zifia: sabendo que suncê somatiza com muita facilidade o sofrimento dos que lhes são próximos, foi que o caboclo Araribóia criou condições de suncê voltar para a Umbanda, como uma forma de evitar que isto ocorresse.
- Meu Pai! Deus é muito bom!
- Até mesmo por que, se isto ocorresse, as crianças assistidas por suncê voluntariamente ficariam sem ter como receber o lenitivo que suncê mais lhes proporciona: o doce remédio do sorriso.
Dona Isabel chorava muito a cada vez que dizia:
- Deus é bom! Obrigada meu Deus! Obrigada!
Pai José esperou sua consulente serenar as emoções e, para encerrar aquele atendimento, disse-lhe:
- Foi o que este nêgo disse a suncê zifia: Zambi-Nosso-Pai enviou Jesus ao mundo para que todos pudessem alcançar a oportunidade de salvarem suas vidas do ódio, do egoísmo, do orgulho e do desamor, pois para Deus o bem maior está acima das individualidades, e é por isto também que a misericórdia Dele é, de fato, infinita! Vá na força e na luz de Deus-Nosso-Senhor!!!!  
- Amem,vovô! Amem!