domingo, 23 de dezembro de 2007

Perdão: luz do amor


Ditado por um amigo espiritual



Acende a luz zifio, pra Nêga Véia enxergar suncê!
Nêga tá no escuro zifio e precisa voltar a ver!
Esse ódio e ignorância fez Nêga Véia estar aqui,
tentando ajudar suncê a encontrar a luz que pode lhe fazer feliz.
Esta luz tá dentro de suncê zifio, suncê só precisa procurar de verdade.
Querer e fazer brilhar a sua vida com a luz que vem da humildade.
Nêga Veia conhece o seu lado escuro zifio e não fica surpresa com o potencial de maldade,
pois Nêga também conhece o seu lado divino na luz: àquele que leva a real felicidade!
Nêga entende seu destempero e rancor, zifio, mas se “alimentar” com o ódio não vai resolver.
Faça uma “dieta” deste alimento para que essa fome possa desaparecer.
Nêga entende sua sede de justiça zifio, sua vontade de “beber” da raiva para ver se esta sede termina,
mas Nêga Véia fala que o único liquido que pode saciar esta sede é aquele formado da água que vem da fonte infalível da Justiça Divina.
Beba desta água zifio, deguste apenas o alimento do amor!
Apenas assim suncê ficará renovado e poderá esquecer esta dor!
Dor que está deixando em trevas todo o coração do zifio:
um lugar onde já houve tanta luz e que hoje tá um breu de tanta tristeza.
Tá tão escuro e gelado que Nêga não consegue ver suncê com clareza
Nêga Véia não gosta de frio zifio e é por isso que pede:
Não se zangue com seu irmão, dobre os joelhos e faça-lhe uma prece!!!
Nêga Véia não gosta de escuro zifio e é por isso que faz um pedido pra sua própria evolução:
Não deixe Nêga Véia na escuridão, zifio!!!
Esqueça tudo e perdoe o seu irmão!!!
Só assim suncê poderá acender a luz que iluminará o teu coração!!!





Saravá a Deus pai Todo Poderoso!!!
Saravá a toda a linha dos preto-velhos!!!
Saravá o perdão, a misericórdia e o amor!!!

terça-feira, 4 de dezembro de 2007

O EDUCANDÁRIO



Ditado pelo Caboclo sete estrelas.


Certa vez estava andando por uma região belíssima que eu, mesmo sendo pouco viajado, tinha a plena convicção de que não pertencia a nenhuma localidade terrestre.
Não sabia como havia parado ali, só tinha dentro de meu peito um enorme sentimento de gratidão pelo Divino Criador haver me proporcionado a oportunidade de poder estar conhecendo um lugar tão maravilhoso: eu caminhava por uma calçada principal circundada por um verde tão lindo que eu parecia estar respirando, junto com o oxigênio, a própria essência vegetal; e no meio de todo este verde existiam flores coloridas e das mais variadas espécies que me faziam ter a sensação de que caminhava em paralelo a um arco-íris maravilhoso .
Olhei bem à minha frente e percebi que aquela calçada conduzia para uma enorme edificação toda colorida de um verde “grama” e que possuía em seu ápice uma estrela de sete pontas ladeada por algumas colunas que possuíam em sua parte superior uma espécie de pirâmide formada de um cristal parecido com mármore totalmente branco.
Não sei por que, mas como alguma coisa dizia dentro de mim que eu deveria adentrar aquela estrutura não pensei duas vezes e assim o fiz.
Quando iria iniciar minhas observações no interior daquele prédio apareceu um senhor de estatura média, cabelos brancos que denunciavam uma calvície acentuada e fisionomia muito simpática apresentando-se como Hermógenes e dizendo que eu não teria permissão para fazer a descrição interna daquela instituição.
Disse, então, a Hermógenes que obedeceria a ele prontamente e lhe perguntei que tipo de instituição era aquela, ao que ele respondeu:
— Penso que não seria interessante você catalogar esta instituição em uma só categoria, mas se mesmo assim você desejar posso lhe dizer que essa instituição funciona como um educandário.
— Como?
— Isto mesmo que você ouviu meu irmão, um educandário.
— Mas um educandário é uma instituição de ensino; qual tipo de ensinamento vocês ministram por aqui?
— Aulas de reforço.
— Como?
— Aulas de reforço.
— Como assim?
— Como funcionam as aulas de reforço nos educandários terrestres?
— Bem, elas têm a função de proporcionar ao aluno que não apreendeu de forma satisfatória um determinado conteúdo uma nova oportunidade de assim faze-lo.
— E o nosso educandário aqui neste plano de existência também trabalha da mesma forma, a diferença é que os conteúdos ministrados aqui não são os mesmos das cátedras terrestres.
Percebendo que eu já não agüentava mais de tanta curiosidade foi que Hermógenes complementou sua fala:
— Nosso educandário fornece aulas de reforço para aqueles irmãos que, por um motivo ou outro, esmoreceram na fé.
— Então você está me dizendo que ao saírem deste educandário as pessoas levam consigo um renovado sentimento de fé em Deus, é isso?
— Não só em Deus, mas também uma renovação expansora do sentimento de fé em si mesmas.
— Então este educandário tem como missão fortalecer o sentimento de fé de seus freqüentadores?
— Exatamente.
— E os freqüentadores deste educandário são espíritos encarnados ou desencarnados?
— Nas duas situações.
— Sério?!?
— Sério. Por que o espanto?
— É que mesmo não sabendo como vim parar aqui sinto, de alguma forma, como se esta localidade ficasse muito distante da crosta terrestre.
— E suas impressões não estão erradas, mas se um espírito encarnado precisar de um “reforço” não poderá ficar sem um auxilio efetivo apenas pelo fator distância, certo?
— Nossa, mas este educandário me parece tão distante da terra! Existem mesmo encarnados que vem aqui para receber estas aulas de reforço?
— Claro que sim, ou você acha que está aqui no dia de hoje tão somente como “repórter espiritual”?
— Eu me encontro com minha fé esmorecida?
— “Conheça a verdade e a verdade vos libertará”, disse uma vez um grande sábio.
— Como?
— Um outro sábio disse: “ conhece a ti mesmo”.
— Mas a minha fé em Deus continua inabalada!
— Até concordo, mas e atua fé em si mesmo?
— .......................
— O teu silêncio me diz que concordas comigo, entretanto, você não está aqui para ser acusado de nada, mas para receber o auxilio que o teu merecimento lhe faculte.
— E para onde devo me dirigir para receber esta benção divina?
— Para o mesmo local onde estão se dirigindo todas as pessoas que você está vendo subir aquelas escadas, ou seja, para o Salão Expansor da Fé Cristalina.
— Como?
— Um auditório meu irmão.
— O senhor poderia me acompanhar, irmão Hermógenes?
— É justamente para isto que estou aqui companheiro. Vamos?
— Claro.
Chegando ao referido auditório procurei assentar-me e pude observar, com certo espanto, que o palestrante da noite tinha o corpo todo banhado por uma tênue luz dourada como se fosse irradiada de dentro para fora, pensei até em fazer um comentário a este respeito com o irmão Hermógenes, mas ao observar que não só ele, mas todos os espectadores encaravam o fato com naturalidade eu, procurando não fazer feio, resolvi silenciar.
O auditório estava completamente lotado, com cerca de mil e duzentas “pessoas”, e a palestra já estava para ser iniciada.
— Boa noite meus irmãos em Deus-Pai Todo-poderoso, o meu nome é Zacarias e estamos todos aqui esta noite com o objetivo de estudar e nos entronizarmos com o Divino sentido da fé cristalina, entretanto, antes de iniciarmos nossos estudos, gostaria que todos firmassem o pensamento comigo na realização de uma prece:
“ Salve divino pai Olorum, causa primária de todas as coisas!
Salve divino pai Oxossi, por ter permitido a presença de todos nós, os vossos humanos filhos, neste santuário sagrado em busca do conhecimento divino!
Salve divino Pai Oxalá, por ter permitido a congregação de todos nós com o objetivo de, através da aquisição de novos conhecimentos sobre o divino, fortalecemos a nossa fé em Ti e na amada religião de umbanda!
Permita Pai supremo e sagrado, que possamos sair daqui renovados e prontos para defendê-lo na prática da nossa amada religião não só com o escudo da fé, mas também com a espada do conhecimento.
Faça com que esta espada divina, em nossas mãos, jamais sirva como um instrumento de ataque e sim como de defesa nas nossas lutas do dia-a-dia contra o preconceito e a intolerância religiosa, contra a timidez que temos em professar a nossa amada religião sem temores e sem pudores.
Permitas, enfim, que possamos servi-lo dignamente com os instrumentos da fé e do conhecimento onde quer que venhamos a ser solicitados na prática da caridade em busca da evolução de nosso espírito.
Que assim seja!”

Devo confessar que acompanhei a prece com todo o fervor do meu coração só que de olhos abertos e sinceramente posso dizer que não me arrependo por que a cena que presenciei foi tão linda que não me faz sentir arrependido: a partir do instante que Zacarias começara a sua prece eu pude observar centenas, milhares de bolinhas douradas descerem do alto do auditório e cairem sobre todos os presentes, inclusive sobre mim. O mais interessante é que estas bolinhas ao alcançarem nosso corpo despertavam uma sensação de fé tão forte em Deus e na vida que as lágrimas de gratidão banhavam facilmente os nossos olhos. Na verdade foi uma cena tão linda que jamais poderei apagá-la de dentro de mim!
Depois da oração Zacarias iniciou a sua prédica:
— Prezados irmãos de fé, estamos reunidos nesta linda noite apenas para que possamos responder uma singela pergunta: a umbanda é uma religião cristã?
Um grande murmúrio começou no salão após esta pergunta, mas o irmão Zacarias retomou a fala:
— Aqueles que acham que a umbanda é uma religião cristã, por favor, levantem a mão direita!
Pode parecer incrível, mas em menos de trinta segundos toda a “platéia” estava com a mão erguida, Zacarias, então, retomou a sua fala:
— Lindo, companheiros!! Muito linda esta cena que acabo de presenciar: todos com a mão direita em riste dizendo de forma unânime que vós, por serem umbandistas, também seguis os preceitos do Cristo planetário. Muitos de vocês levantaram as mãos conscientes do porque a umbanda é uma religião cristã, outros inconscientemente, mas isto não é importante, o importante é todos vocês terem a idéia de que a umbanda é cristã. Estamos aqui esta noite para discutirmos esta questão da cristandade da umbanda, para expandirmos nossa visão do Cristo, para expandirmos nossa visão da umbanda, pois da mesma forma que Jesus não é só a umbanda, a umbanda também é Jesus e muito mais.
Devo confessar que é ótimo palestrante o irmão Zacarias! Sabe a hora certa de colocar cada vírgula com precisão em sua prédica. Continuamos eu e toda a platéia a escutá-lo:
— Muitos dos irmãos aqui presentes sabem que Jesus não é o orixá Oxalá, ou seja, aquele responsável pela irradiação do sentido da fé em toda a criação divina, mas Jesus é um ser fatorado na irradiação de Oxalá, é o Cristo planetário, aquele responsável pela irradiação divina da fé em todo o planeta Terra, mas não em toda criação divina. Sendo assim, Jesus é um irradiador do divino sentido da fé em todas as religiões existentes na terra, até mesmo daquelas que não se dizem cristãs e foi justamente por isso que eu disse que Jesus não é só umbanda, ou seja, Jesus não é um irradiador do sentido da fé apenas na religião de umbanda, mas em todas as religiões do planeta.
A umbanda, meus amados irmãos de fé, é cristã por que segue a risca os divinos mandamentos de Jesus: “Amar a Deus acima de todas as coisas e ao próximo como a ti mesmo”, Jesus é amor e a umbanda também é amor justamente por praticar este abnegado amor através da caridade.
Muitos irmãos de fé ficam receosos de dizerem que são cristãos quando são perguntados em relação a isto pelo fato do umbandista muitas vezes considerar como cristãos somente aqueles que seguem a bíblia, entretanto, como já disse anteriormente, cristão não é aquele que segue a bíblia, mas aquele que segue os preceitos de amor fraterno e incondicional do Cristo.
O umbandista só por levantar a bandeira da caridade pode e deve se considerar cristão.
Entendam meus amados que a umbanda é uma religião bem recente e que, justamente por este fato, ainda não possui um livro religioso que possa ser considerado como único para todos os irmãos de fé, tais como a própria bíblia ou o alcorão; mas não se enganem por que, a despeito deste fato, a umbanda tem princípios teológicos que são intrínsecos a ela tais como as Sete linhas de umbanda que, por sua vez, justificam o que disse anteriormente no que concerne a relação entre umbanda e Jesus, qual seja, “a umbanda é Jesus e muito mais”, pois vejam meus amados, Jesus é um representante do divino sentido da fé, mas sete são as linhas de umbanda e sete são os sentidos da criação Divina, isso significa dizer que além do sentido da fé, irradiado por Oxalá, a umbanda tem, através da irradiação dos Orixás, mais seis sentidos que são: justiça, lei, conhecimento, evolução, vida e amor.
A umbanda é Jesus e muito mais. É Jesus, mas também são os Orixás, os Caboclos, os Preto-velhos, as Crianças, os Exus e Pomba-giras, etc. Este fato não faz da umbanda uma religião melhor e nem pior que as demais, faz dela uma religião que é única, natural, com sua própria teologia e que, justamente pelos fatos expostos, não deve servir de empecilho para que os umbandistas andem entre seus irmãos por paternidade Divina e de outras denominações religiosas, com a cabeça erguida, com orgulho de se dizerem umbandistas e com a sabedoria de se afirmarem também enquanto cristãos. Caminhem com esperança pelo mundo por que Deus é convosco, caminhem em direção a Deus todos os que se sentem injustiçados e o amor de Xangô irá consolá-los, caminhem em direção a Deus todos que se sentem desesperançados que Yemanjá há de gerar vida em abundância em vossas existências. Sejam felizes meus amados e que Deus os abençoe.
Quando o irmão Zacarias terminou sua explanação fiquei estupefato ao perceber que todos nós, os expectadores, estávamos irradiando uma luz muito forte na região acima de nossa cabeça, olhei ao lado para Hermógenes e, graças a Deus, ele pôde me responder:
— Lembra quando eu lhe disse que este prédio é um educandário com o propósito de fortalecer a fé?
— Perfeitamente.
— Pois bem, esta luz irradiada pelo chacra coronário de vocês significa que o objetivo de fortalecimento da fé foi alcançado.
— Meu Deus, mas que coisa mais linda!
— É companheiro, a fé é luz que ilumina a vida de todo espírito que procura desenvolvê-la.
— É verdade.
— Que Deus abençoe não só a você, mas a todos que aqui estiveram, fazendo com que, de alguma forma, vocês possam sempre orar e vigiar a fim de manter o brilho de vossas coroas do jeito que está e, porque não dizer, aumentá-lo de intensidade ainda mais.
Quando Hermógenes acabou de me dizer esta frase nós já estávamos do lado de fora do educandário e foi então que eu perguntei a ele:
— Quer dizer que a minha tarefa de hoje está acabada, que eu já vou retornar para o corpo físico?
— A tarefa de lustrar cada dia mais o brilho de sua coroa através do exercício da fé raciocinada e da prática da caridade não termina nunca, você me entende meu amigo?
— Sim senhor!
— Já está na hora, de fato, de você retornar ao corpo físico, mas não vá sem antes dar um abraço neste Caboclo.
Procurei aproximar-me dele achando inusitado não só o fato dele me pedir um abraço, mas também por ele ter dito que é um Caboclo e ter me chamado de “amigo” e o questionei em relação a este fato, ao que ele respondeu-me:
— Só um amigo oferta um abraço a outro, você não está me reconhecendo?
— Desculpe, mas, não senhor.
— Não importa. O importante é que nos conhecemos, me dê cá um abraço!
Abracei-o com lágrimas nos olhos e agradeci:
— Obrigado por tudo irmão Hermógenes!!!
— Este Caboclo é que agradece. Vá na força e na luz de Tupã nosso pai e nunca se esqueça de que meu nome pouco importa.
— Sim senhor.
— Importante é o laço fraterno da amizade.
— É verdade!
— Meu nome não é importante até mesmo por que aos olhos do Criador eu nada sou.
— Que é isso irmão Hermógenes!
— Não estou com autocomiseração, estou apenas constatando o fato de que nenhum espírito jamais deve se acomodar na prática da caridade, pois a evolução não cessa nunca. Eu digo que nada sou não como um gesto de atitude humana e pessimista, mas como uma mola propulsora que sempre possa me impulsionar em direção à humildade, a fraternidade e caridade.
— Sim senhor.
— Como estava dizendo eu, aos olhos do Criador, nada sou, mas quando tenho que ser alguma coisa, então sou como a cor de uma única pena de papagaio.
— Como?
— Vá na força e na luz de Tupã nosso pai!!!
Acordei e não entendi a metáfora, os dias se passaram e nada. Só agora, meus irmãos de fé, no momento em que lhes passo esta mensagem é que tudo ficou claro: O irmão Hermógenes, trabalhador do educandário onde existe o Salão Expansor da Fé Cristalina, é, como ele mesmo disse, da cor de uma única pena de papagaio, ou seja, o irmão Hermógenes é um Senhor Caboclo Pena Verde.





Salve o conhecimento!!!
Salve a fé!!!
Salve os Senhores Caboclos!!!
Salve o Sr. Caboclo Pena verde!!!

quarta-feira, 14 de novembro de 2007

A verdade absoluta

Ditado pelo Caboclo Sete Estrelas.



Estava andando por uma extensa rua de uma localidade em que nunca estive anteriormente quando uma cena inusitada chamou minha atenção: um homem branco, com aproximadamente trinta anos de idade, cabelos castanho-claros, 1,85mts de altura, olhos azul-esverdeados e barbudo estava a fitar com o olhar marejado e num estado contemplativo uma residência em específico.
Numa incontida vontade de entender o que estava acontecendo procurei me aproximar da pessoa em questão:
— Olá amigo, você me desculpe à interrupção em seu momento contemplativo, mas será que eu poderia lhe oferecer alguma ajuda?
— Ajuda?
— Sim, por que eu estou vendo estas lágrimas em seu olhar e penso que a causa delas deve ser pelo seu desejo de entrar na casa, é isso?
— Não. Na verdade eu e mais milhares e milhares de amigos somos os zeladores desta residência à nossa frente.
— Zeladores?
— É. Nós procuramos dar manutenção a ela da maneira que nos for permitido.
— Os moradores da casa não permitem que você faça a manutenção da casa é isso?
— De forma alguma. Na realidade nós, os zeladores, somos sempre bem-vindos neste lar.
— Então você poderia me explicar por que esta residência se encontra sem acabamento e proteção externa como muros e portões?
— Companheiro é como eu lhe disse antes, nós zeladores procuramos realizar uma manutenção nesta casa da forma que nos for permitido. Entenda que a função nossa não é construir, mas sim cuidar e zelar por tudo que foi ou venha a ser construído.
— Entendo.
— Penso que você não deveria se espantar com o fato de eu estar contemplando esta casa de maneira tão embevecida.
— Não? Acontece que eu esperei cerca de uma hora antes de vir aqui conversar contigo e, durante todo este tempo, você não desviou o olhar desta residência uma vez sequer.
— Uma hora?
— Exatamente.
— Penso que você não deveria se espantar com este fato.
— Mas, por quê?
— Por que estou há muito tempo fazendo isto.
— Observando esta casa?
— Exatamente.
— E há quanto tempo você está a observar esta casa?
— Há quase um século.
— Olha amigo você me desculpe pela intromissão, por favor, volte a fazer o que você estava fazendo por que eu vou continuar a minha caminhada, tudo bem?
— Você não acredita não é companheiro?
— Em que? No fato de que você está a quase um século observando este lar? Você me desculpe, mas eu tenho de ser sincero e lhe falar que não.
— Tudo bem você não é o primeiro a duvidar deste fato.
— Sério?
— Certamente, mas se você quiser uma prova do que lhe digo, eu teria imensa satisfação em oferecê-la.
— Eu aceito tua proposta.
— Tudo bem, mas antes permita que eu me apresente: meu nome é Horácio!
— Muito prazer e o meu nome é.....
— Desculpe-me interrompe-lo, mas acredite-me quando digo que lhe conheço muito bem.
Quando Horácio proferiu estas últimas palavras eu tive a nítida sensação de que ele era algum tipo de Ser espiritual evoluído, mas não me fiz de rogado e procurei escutar um pouco mais de sua conversa antes de chegar a alguma opinião conclusiva, lhe respondendo:
— Tudo bem Horácio, você não precisa se desculpar.
— Agradeço pelo voto de confiança, mas agora procure sentar no chão que eu vou lhe fornecer a prova da veracidade de minha história.
Segundos após me sentar e fechar os olhos, Horácio pousou a destra em minha fronte e eu passei a ver a construção daquela residência desde o seu principio: vi a construção de sapatas e vigas, o surgimento das paredes e do teto, instalação de dutos de água e fiação para energia elétrica e a fixação de portas e janelas; então, de repente, quando pensei que iria presenciar a realização do acabamento da residência eu fiquei a observar o tempo passar, ano após ano, e a casa a permanecer sem reboco, sem pintura, calçamento, água, energia elétrica e, para meu desespero, sem muro e sem portão.
O tempo ainda continuou a passar por muito tempo diante de meus olhos e eu também pude verificar a casa ser submetida a terríveis tempestades e ventanias. Vi, ainda, várias pessoas com rostos inidentificáveis a atirarem pedras na vidraçaria da casa ( única benfeitoria realizada nela ) e nada acontecer com esta: nem mesmo um mínimo trincado.
Vi, então, os anos se passarem até os dias atuais e foi neste momento que Horácio retirou sua destra de minha fronte e, segurando-me pela mão direita, convidou-me a levantar e adentrar àquela residência.
Ao entrar naquela casa um fato espantoso chamou minha atenção por que se por fora parecia uma casa simples de três quartos, por dentro ela parecia, em termos de extensão e número de quartos, uma verdadeira mansão com uma quantidade de cômodos infindáveis.
Pude perceber também que a grande maioria de seus residentes encontrava-se acordada enquanto apenas alguns poucos estavam dormindo àquelas altas horas da noite. Vi, ainda, que apesar de não ter energia elétrica e água encanada a casa possuía várias lamparinas e velas a iluminá-la e um poço artesiano com o qual eles obtinham água.
Após todas estas observações Horácio convidou-me a retornar para o lado externo da casa e perguntou se eu possuía alguma dúvida em relação ao que observara e eu, assim, lhe respondi:
— Olhe Horácio, de fato, eu tenho algumas dúvidas: Primeiramente eu gostaria de saber por que a casa, tirando a vidraçaria, não tem nenhum tipo de acabamento e proteção que a guarde de vândalos e de intempéries climáticas; depois, eu gostaria de saber quem são os vândalos que eu observei, ao longo dos anos, atirarem pedras e mais pedras em direção à vidraçaria e, por ultimo, ficaria imensamente ditoso se você me dissesse por que a vidraçaria da casa não se espatifou uma única vez até hoje apesar do tamanho e da intensidade das pedras que são atiradas contra ela.
— Muito bem, vamos por partes! Esta casa encontra-se sem acabamento e proteção externa devido ao fato de, desde o momento de sua fundação até os dias atuais, seus moradores não chegarem a um acordo sobre qual é o melhor tipo de acabamento para ela.
— Como? Toda esta demora é devido à indecisão?
— Não. O atraso é devido aos egos extravasados de seus moradores por que, para que a casa possa ser acabada e protegida, é importante à concordância dos moradores e é pelo fato disto não ter acontecido até hoje que você vê, atualmente, as condições em que esta residência se encontra.
— Entendo.
— Os vândalos que você notou a atirarem pedras na casa são, pasmem, os seus próprios moradores.
— O que? Mas, por quê?
— É como eu lhe disse: egos extravasados!!! Como os moradores têm pontos de vista diferentes entre si no que diz respeito ao acabamento e proteção externa da casa é que grande parte deles procura destruir a vidraçaria da casa, julgando-se o único dono da casa e dizendo que se ela não pode ficar do jeito que lhes cabe, que não ficará do jeito de mais ninguém; entretanto, como a vidraçaria foi colocada nas janelas com o consentimento de todos os moradores e como a casa conta com a proteção Divina é que eles não conseguem danifica-la, nem destruí-la.
— Meu Deus Horácio, mas isto é um grande equivoco!!! Os moradores deveriam se unir para efetuarem o acabamento e proteção externa do lar a fim de resguardá-la de tempestades e ventanias.
— Penso que os moradores realmente deveriam fazer o que você sugere, mas não por causa do clima.
— Hein?
— Entenda companheiro que o clima é um fator natural, corriqueiro e divino sendo, justamente por isto, incontrolável ao homem. Muitas vezes uma tempestade é até mesmo necessária seja para testar a resistência da estrutura da casa, seja para unir seus moradores, pelo menos momentaneamente, tendo em vista que a tempestade, ao os impedirem de sair do lar, acaba oportunizando condições para que se conheçam ainda mais. Na verdade, penso que os moradores deveriam fazer o acabamento da casa e protegê-la a fim de que todos, juntos, possam encontrar melhores condições de nela viver, usufruindo de seu conforto com sinergia.
— Puxa vida Horácio, percebo que você tem grande sabedoria!!! Rogo a Deus que todos os moradores possam se conscientizar do fato de que tudo o que você acabou de me dizer é impreterível e incontestável e, enfim, possam deixar suas idiossincrasias de ladoeiro e divino sendo, justamente por isto, incontrolr para efetuarem o acabamento e proteçdr da pessoa em quest e realizarem o acabamento e proteção desta casa!
— Você quis dizer nossa casa, não é?
— Nossa?
— Claro! Minha, sua e de todos quantos dela precisarem.
E, ao dizer esta frase, percebi o corpo de Horácio se transformando e entendi que ele não era tão somente um Ser espiritual evoluído, mas também um Senhor Caboclo que milita na Lei de Umbanda. Ao perceber este fato fiz menção de me ajoelhar aos seus pés e reverenciá-lo, mas Ele percebendo minhas intenções disse:
— Não precisa se ajoelhar1
— Mas...
— ...acredite-me quando digo que sei de seu respeito por mim, mas não duvide quando eu lhe determino que não se ajoelhe à minha frente por que sei que isto poderia bloquear todo o seu mental e impedir que eu continue a lhe passar esta mensagem sobre nossa casa.
— Sim senhor!!!
— Em relação à casa você nada percebeu, não é companheiro?
— Como assim?
— Esta casa que você vê a sua frente ainda não acabada representa a religião de umbanda, companheiro!!!
— Meu Deus!!!!
— Esta casa e todas as visões que você teve quando pus minha destra em sua fronte são representações simbólicas para que todos vocês, umbandistas, entendam a nossa mensagem!!!
— Acho que estou começando a entender!
— Os detratores desta louvável religião que vocês professam e que, muitas vezes, são vossos irmãos de jornada de outras denominações religiosas estão representados, em sua visão, pelos ventos, chuvas e tempestades que, na verdade, simbolizam a oportunidade dada por Deus para que os moradores da casa possam se unir com o objetivo único de finalizar sua construção e proteção a fim de que venham a ganhar força e melhor defesa contra estes “fenômenos climáticos”.
Já começando a compreender as analogias, simbologias e sabedoria daquela entidade espiritual eu, então, ousei lhe fazer mais uma pergunta:
— Irmão Horácio, desculpe a interrupção, mas o senhor poderia responder uma pergunta?
— Certamente, companheiro!
— É que eu gostaria de saber quem eram as pessoas com rostos inidentificáveis que eu, em minha visão, observei apedrejando a vidraçaria da casa. Por acaso estas pessoas também seriam estes irmãos de jornada pertencentes a outras denominações religiosas?
— Você pode não se lembrar, mas esta pergunta eu já lhe respondi anteriormente!
— Como assim?
— Estas pessoas companheiro, são os próprios moradores da casa!
— O que? Os próprios umbandistas? Mas, por quê?
— Esta pergunta eu também já lhe respondi antes, mas posso repetir: cada um dos moradores da casa quer que ela, ou seja, a umbanda, tenha o acabamento e proteção que lhes convém como melhor e, como não chegam num acordo e julgando-se os únicos donos dela, passam a afirmar que se ela, a casa, não pode ficar “do jeito” deles, que também não ficara de jeito algum. Muitos destes moradores, inclusive, ficam num estado de ânimo tão alterado que passam a jogar pedras na vidraçaria da própria casa onde residem.
— Meu Deus!!!!
— Mas como a vidraçaria foi colocada de comum acordo entre todos os moradores e, principalmente, como a casa é protegida por Deus, nenhum destes objetos arremessados consegue destruí-la.
— Puxa, a proteção de Deus é maravilhosa! Mas esta atitude dos moradores da casa é terrível, não é verdade irmão Horácio?
— Nem tanto!!! Terrível mesmo é vê-los habitarem a residência há quase cem anos sem fazer muito esforço para realizarem benfeitorias e proteção essenciais a fim de que possam crescer verdadeiramente enquanto religiosos que são.
— Além de terrível, também é incompreensível, não é irmão Horácio?
— Na verdade companheiro, eu posso compreendê-los!
— Sério!?!?
— Certamente. Vocês seres humanos na carne ainda estão bastante longe da perfeição e é justamente uma de suas maiores imperfeições que os fazem ver como verdade absoluta aquilo que vocês julgam verdade e afirmar que é mentira aquilo que para outros é verdade absoluta. Na verdade companheiro a única verdade absoluta existente é Deus e a luz de seu arco-íris sagrado que reflete em sete cores os sete sentidos da Sua criação que vocês devem fazer brilhar na terra em forma de caridade. Vocês, umbandistas, deveriam se unir em torno em torno deste brilho supremo para que possam adquirir sinergia e serem um foco de irradiação deste Setenário sagrado.
— Nossa!!! Irmão Horácio, que palavras lindas!!! Estou profundamente emocionado!!!
— Fico feliz com tua emoção, pois isto significa que minhas palavras encontraram eco em sua consciência e em seu coração; entretanto, infelizmente, só se emocionar não basta!!! É vital o entendimento entre vocês umbandistas para que possa ser realizado o acabamento e proteção da casa!!!
— Entendo. Mas, diga-me irmão Horácio, é esse o motivo de eu estar percebendo o vosso olhar marejado de lágrimas: o desentendimento entre nós umbandistas? São lágrimas de tristeza?
— Pelo contrario companheiro: são lagrimas da mais profunda e sincera alegria!
— Como? Alegria? Mas, por quê?
— Você se recorda quando esteve comigo, no interior da casa, do fato de que apenas a minoria de seus moradores encontrava-se dormindo?
— Sim, lembro.
— Sabe por que eles estavam dormindo?
— Não.
— Pois eu lhe digo que eles estavam dormindo o afamado “sono dos justos”.
— Hein? Não entendi!!!
— Então entenda que foram aqueles poucos moradores os únicos que procuraram cavar o poço artesiano para que, não somente eles, mas todos os moradores da casa tivessem algo para beber e fazerem o seu asseio.
— Verdade?
— Certamente. Também foram estes poucos moradores que providenciaram lamparinas e velas para que a casa não ficasse na mais profunda penumbra.
— E os demais moradores, por que não os ajudaram?
— Por que se encontram tão ensimesmados em seus egos e vontade de que a casa tenha o acabamento por eles desejados que acabam ignorando qualquer tipo de benfeitoria paliativa que seja realizada na casa e que por eles não tenha sido idealizada. Na verdade companheiro, estes poucos moradores sofreram, e ainda sofrem, ataques terríveis por parte dos demais.
— Mas, por quê?
— Foram e são acusados de demagogos, de “quererem aparecer”.
— Que horror!!!
— Mas mesmo com tudo contra ou nada a favor estes moradores valorosos não desistiram de seu intento e, com muita fé e determinação, conseguiram realizar benfeitorias paliativas que acabaram tornando-se vitais para todos os moradores da casa.
— Impressionante!!!
— Pois então, minhas lagrimas de alegria são motivadas por estes filhos de fé que priorizam o bem-estar geral dos moradores e da casa em detrimento de suas idiossincrasias em querer apontar qual é o melhor acabamento para ela. Entenda que enquanto houver pelo menos um filho de fé que pense e procure agir desta forma, sempre haverá o brilho de uma lagrima de alegria no olhar deste caboclo!!!
— Meu Deus!!! O senhor acabou de dizer mais uma coisa muito linda!!!
— Pode até ser companheiro, mas é extremamente importante que vocês moradores desta casa lutem com todas as forças para combaterem, primeiramente, dentro de vocês mesmos a terrível imperfeição da vaidade a fim de que também não seja transformada em verdade absoluta um dito bastante disseminado entre os umbandistas.
— Irmão Horácio nós umbandistas, de fato, falamos muitas coisas. Nós costumamos dizer: “Saravá!”, “Salve Jesus!”, “ Salve a vossa força!”e muitas outras coisas, mas sobre qual dito em especifico o senhor está falando?
E Ele, antes de colocar sua destra novamente em minha fronte e me fazer despertar, no plano físico, em cima de minha cama, ainda pôde dizer:
— “O maior adversário da umbanda é o próprio umbandista!”
Eu acordei em minha cama e fiquei a meditar profundamente, na época do ocorrido, em tudo o que Ele havia dito para mim. Aliás, para falar a mais pura verdade, eu estou a meditar até hoje!!!!!!!!


























sexta-feira, 2 de novembro de 2007

Consolação


“Conta-se que aproximadamente há cinco mil anos, em um reino muito distante, o rei de uma enorme nação resolveu colocar a mão de sua filha, com o consentimento desta, como troféu para aquele que primeiro conseguisse atravessar toda a extensão de um enorme deserto. Aqueles que não conseguissem cumprir a tarefa, entretanto, deveriam pagar com a própria vida.
Talvez tenha sido pelo temor à morte que apenas quatro pretendentes apareceram para tentar desempenhar a tarefa.
Ao comparecerem no local que seria o ponto de partida para a grande jornada o rei, em pessoa, explicou as três regras que deveriam ser impreterivelmente obedecidas ao longo de todo o percurso:
1) A travessia deveria ser realizada a pé.
2) Existiam quatro caminhos para se realizar a travessia e cada pretendente deveria escolher apenas um dentre estes.
3) A travessia só poderia ocorrer antes da chegada do período noturno, porque a noite cada pretendente deveria descansar visando à recuperação de forças para o dia seguinte.
Com as regras bem explicadas e entendidas cada pretendente procurou organizar de forma eficiente os instrumentos e apetrechos necessários para a realização da empreitada.
Sete dias depois, às sete horas da manhã, cada pretendente, com cada um de seus caminhos escolhidos através de um sorteio, pôs-se a caminhar para tentar alcançar seus objetivos.
O que cada um destes pretendentes não sabia era o fato de que não pagaria com a vida aquele que não conseguisse cumprir a tarefa; na verdade, este argumento já representava um teste de coragem e bravura realizado pelo rei com vistas a arranjar o melhor pretendente para a sua filha.
E assim para cada um dos pretendentes iniciou-se a grande jornada.
O pretendente que estava no primeiro caminho era o príncipe de um grande reino oriental que pretendia contrair laços de matrimônio junto à princesa com o objetivo meramente político de uniões de terras e ampliação de poderes.
O pretendente que estava no segundo caminho era um soldado do exército daquele reino que pretendia conseguir atravessar o deserto tão somente com o objetivo de tornar-se um homem extremamente rico e bem visto aos olhos do rei.
O pretendente que estava no terceiro caminho era considerado o maior poeta do reino e estava com o propósito firme de ser o primeiro a concluir a travessia exclusivamente por ser conhecedor da fama esplendorosa no que dizia respeito à beleza da princesa.
Já o pretendente que estava no quarto caminho era um pastor de ovinos considerado até mesmo um maluco desde o momento em que explicou ao chefe do clã de que era membro o motivo que o levou a querer seguir aquela caminhada: havia tido um sonho onde um vulto que ele não conseguia ver, mas que lhe irradiava uma grande paz, determinara-lhe que aceitasse o desafio do rei e atravessasse o deserto.
Desde o momento do relato do sonho ao seu clã até o momento de sua partida para a travessia no deserto ele tornara-se o motivo de chacota de sua comunidade; entretanto, sua grande fé no Divino criador e suas experiências anteriores com estes tipos de sonho fizeram com que ele desse pouca importância às provocações.
Dizem que o período total para a travessia deste deserto, a pé, é de dez dias, mas já no sétimo dia os três primeiros pretendentes ficaram sem água e apenas com raríssimos mantimentos; o quarto pretendente, por sua vez, devido ao fato de já estar acostumado a viver com pouca água e alimentos e também por estar acostumado a andar, a pé, grandes distâncias por dia, ainda estava com sua quantidade de água e alimentos pela metade.
Na manhã do oitavo dia os três primeiros pretendentes caminhavam com as últimas forças que possuíam em seus músculos, sendo que os dois primeiros sinalizavam um principio de desidratação. Quando chegou o período vespertino deste dia, os quatro caminhos estranhamente converteram-se em um só e quando começou a despontar no céu os primeiros orbes celestes do período noturno os quatro pretendentes se encontraram na convergência dos quatro caminhos; neste instante, os dois primeiros pretendentes desmaiaram e o terceiro caiu de joelhos ao chão implorando água. O pastor de ovelhas, então, correu de encontro ao terceiro pretendente e começou, pouco a pouco, a derramar água em seus lábios para, em seguida, socorrer aos dois primeiros pretendentes também com a água. Mas o verdadeiro socorro que o pastor prestou aos seus colegas de ventura foi uma intensa e fervorosa prece a Deus pedindo auxílio e direcionamento sobre a forma como ele deveria fazer para resolver o problema que se apresentara à sua frente.
Conta-se que alguns poucos minutos após esta oração, repentinamente, apareceu um cavalo que galopou a curtos passos em direção ao pastor até parar em sua frente.
O pastor de ovelhas, a estas horas, já tinha ignorado até a regra que proibia a caminhada no período noturno e a regra que só os permitia andar a pé durante o percurso, para colocar os dois pretendentes desidratados em cima da montaria e enlaçar os braços do terceiro pretendente às suas costas pondo-se a caminhar com o intuito único de chegar ao final da travessia e procurar uma ajuda mais efetiva para seus companheiros de jornada.
E assim passaram-se a manhã, à tarde e a noite do nono dia.
No período vespertino do décimo dia o pastor, ao ver que para concluir a travessia deveria escalar uma enorme pedreira que estava em seu caminho, desanimou severamente e prostrou-se de joelhos no chão. Lágrimas pesadas e copiosas vieram a sua face como se aquela pedreira representasse o fracasso na sua intenção de salvar a vida de seus irmãos e a sua própria.
O pastor, assim, procurando encontrar as últimas forças de seus músculos, levantou-se e retirou de cima da montaria os corpos, ainda com vida, dos dois primeiros pretendentes e juntou-os ao corpo também vivente do terceiro para, após, ajoelhar-se ao chão, junto destes, e fazer uma última prece ao Criador ( por que ele já estava sentindo a vida esvair-se aos poucos de sua carne ) com o intuito de Lhe agradecer por, ao menos, ter chegado até ali na companhia de seus colegas de provação.
Mas ao ajoelhar-se, e antes de fechar os olhos, o pastor viu um homem alto, muito musculoso e com a pele de tom avermelhado como fogo descendo do alto da montanha e aproximando-se, a passos largos, de onde estava. Já quase sem forças o pastor ainda conseguiu perguntar:
— Quem é você?
— Sou um enviado do rei.
— Mas....
— Por favor, irmão eu estou observando que você e seus companheiros estão quase mortos. Antes de tentar esclarecer suas dúvidas eu gostaria que você bebesse um pouco dessa água, tudo bem?
— Sim.
E respondendo a pergunta o pastor pôs-se a tomar, de olhos fechados e sôfregos, daquela água que lhe foi ofertada. Somente após estar saciado e sentir-se estranhamente revigorado mental, emocional e fisicamente foi que ele abriu os olhos para ver qual “ tipo” de água era aquela. Qual não foi sua surpresa ao observar que o líquido que havia ingerido apesar de temperatura e “gosto” de água, era, na realidade, lava incandescente. E, após este fato, o pastor desmaiou.
Alguns instantes depois e, já explodindo de curiosidade, o pastor questionou a quem lhe oferecera a “água”.
— Mas que brincadeira é essa? Que coisa foi essa que você me deu?
— Não fiz nenhuma brincadeira contigo companheiro. Reparaste como esta água o revigorou de todas as formas possíveis, instantaneamente?
— Sim.
— Sabe por que isto aconteceu assim?
— Não.
— Porque você bebeu de “minha” água.
— “Sua” água?
— Exatamente.
— E que água seria essa?
— A água do fogo vivo que purifica com amor todos os desequilíbrios e equilibra amando tudo o que é purificado.
— Ou seja?
— A “água” da justiça divina.
E o pastor pensando estar na frente de alguma divindade ajoelhou-se e estava prestes a fazer um ritual de adoração quando foi interrompido por seu interlocutor.
— Levante-se companheiro eu não sou nenhum tipo de divindade e, além do mais, sou eu quem deve reverenciá-lo.
E dizendo isto o homem de pele avermelhada ajoelhou-se e fez reverência ao pastor, mas também foi por este interrompido.
— Levante-se meu irmão, se você não se julga digno de receber uma reverência minha, como posso eu pensar que seja digno acontecer o contrário?
— Mas eu não estou a reverenciá-lo!
— Como não?
— Entenda companheiro que ao prostrar-me de joelhos à sua frente eu estou a reverenciar as suas atitudes.
— Mas, como assim?
— Não foi você quem abdicou de sua própria água e de seu próprio alimento em favor de seus companheiros de jornada?
— Sim.
— Não foi você que, ao realizar este gesto, salvou a vida deles?
— Sim.
— Também não foi você que ao avistar uma montaria, ao invés de tomá-la para si e deixar os demais companheiros para trás, fez o oposto e a doou para os dois companheiros que se encontravam desidratados?
— Sim.
— E,ainda, não foi você que já no final da jornada, quando viu uma pedreira,apesar de estar com poucas forças, ao invés de deixar os companheiros de jornada para trás e tentar salvar-se, procurou ficar junto deles?
— Sim.
— E por último, e não menos importante, não foi você que, pensando estar em seus últimos momentos de vida, ao invés de se desesperar, prostrou os joelhos no chão e fez uma prece ao Divino criador não só por sua alma, mas também pela de seus companheiros?
— Sim.
— Então, são essas suas atitudes que hoje eu estou aqui a reverenciar.
— Mas quem ouve você falar assim pensa que eu sou algum tipo de grande herói abnegado, quando na verdade eu só estou aqui presente no dia de hoje.....
— .....devido a orientação que recebeu de um vulto através de um sonho seu.
— Mas como você sabe de tudo isto?
— Olhe bem dentro de meus olhos!
— Meu Deus!!! Agora estou percebendo, você é o vulto que me passou a orientação através do sonho!!!
— Isto mesmo.
— Mas por quê?
— Para ver se você estava pronto.
— Pronto para que?
— Pronto para me ajudar a mover pedreiras.
— Como?
— Exatamente como você ouviu: mover pedreiras.
— Mas isto é impossível.
— É? Então apenas observe.
E dizendo isto o homem de pele avermelhada fechou os olhos e levantou as duas mãos ao alto para logo após, num tipo de evocação, retirar a pedreira do lugar original e, movendo os braços, colocá-la em outro lugar. E foi então que o pastor de ovinos, boquiaberto, disse:
— Meu Deus, mas só tendo muitos poderes para se fazer isto.
— Engano seu, companheiro, um só poder basta para se fazer o que fiz.
— Qual tipo de poder é esse?
— O poder da fé. Se você tiver fé poderá mover toda e qualquer pedreira, independente do material de que seja feita.
— Verdade?
— Certamente, e você, por ter o filho da fé bastante enraizado na sua mente e no seu coração, em breve, e com muita disciplina e dedicação também estará trabalhando junto comigo no auxílio à remoção de pedreiras.
— Filho da fé?
— Exatamente: o amor ao próximo. Mas agora venha filho meu, já está na hora de você vir comigo para iniciar o seu aprendizado.
— Ir contigo? Mas como, se estou percebendo que somos de planos de existência diferentes?
— Diferentes?
— E não somos?
— Filho meu, passado alguns momentos, sinto que já é hora de você conhecer a verdade. Feche os olhos!
E dando esta ordem o homem de pele vermelha colocou sua destra na fronte do pastor por alguns momentos para logo em seguida determinar:
— Agora vire-se lentamente e observe atrás de si.
E ao realizar a determinação que lhe fora passada, o pastor teve uma visão que o deixou vivamente impressionado: praticamente aos pés da pedreira ele via o seu corpo físico já sem vida, ao mesmo tempo em que se tocava querendo encontrar algum tipo de explicação para o que vivenciava.
— Entendeu filho meu? Você encontra-se desencarnado!
— É eu estou vivo mesmo sabendo que para o mundo físico eu esteja morto, é isso?
— Exatamente.
— Meus três companheiros de jornada estão vivos? Será que eu poderia fazer algo por eles?
— Com esta pergunta, que demonstra profundo altruísmo, vejo que você realmente passou em sua prova. Posso lhe dizer que em poucas horas eles despertarão e sairão daqui todos com vida.
— Verdade?
— Certamente. A hora deles ainda não chegou. Mas agora, filho meu, já é momento de você vir comigo.
— Antes eu poderia lhe fazer uma pergunta?
— Sim.
— Você poderia me dizer o seu nome e como é seu trabalho?
— Nomes terrenos eu já tive vários e ainda terei muitos; entretanto, posso lhe passar um nome com o qual serei conhecido daqui a cinco milênios: sou O Senhor Caboclo Sete Pedreiras e trabalho nos campos da fé, removendo as pedreiras de problemas da vida daqueles que sejam merecedores, além de labutar também nos campos da justiça promovendo o equilíbrio nos sete sentidos da criação divina.
— Sete?
— Sim: conhecimento, amor, vida, evolução, lei, fé e justiça. Agora vamos filho meu!
— Sim senhor!
— Mas antes eu lhe peço que jamais, em toda sua existência, se esqueça de que foi na frente de uma pedreira que você, pela última vez no plano físico, praticou o amor ao próximo e levou alívio aos corações e que, justamente por este fato, conheceu a verdade da vida eterna e venceu, com amor, as agruras do plano físico encontrando consolação para as dificuldades que o afligiam, certo?
— Sim senhor!
— Mas agora vamos que já está na hora de você iniciar seu trabalho em favor do próximo servindo a Deus por meio de meu pai, que também é rei, e ao lado de suas duas filhas, as princesas que você adquiriu o direito de chamar de suas enquanto se fizer merecedor.
— Seu pai, minhas princesas?
— Sim, isto mesmo que você ouviu: o meu pai Xangô.
— E qual é o nome das princesas?
— Uma delas todos os seres humanos já viram pessoalmente e os que não viram, certamente, ainda verão.
— Verdade?
— Sim. Isto se dá por dois motivos: primeiramente por ela trabalhar diretamente a favor do Divino criador; depois pelo fato Deste tê-la dotado com a faculdade da onipresença.
— E qual o nome dela?
— O nome desta divina filha de meu pai Xangô é Justiça. A outra filha de meu pai, por sua vez, apesar de também trabalhar diretamente a favor de Deus, não recebeu deste a faculdade da onipresença, mas sim a da excelsa formosura e o dom de provocar a transmutação mental, emocional e espiritual em todos aqueles que a visualizarem e que por ela se encantarem sendo, talvez justamente por este fato, que raríssimos seres humanos puderam conhece-la verdadeiramente, apesar de sua rara beleza.
— E qual seria o nome desta flor que, apesar de me parecer tão bela, tenho a impressão de ser invisível aos olhos humanos?
— Realmente, esta filha de meu pai Xangô é uma linda flor; não obstante, ela não é invisível aos olhos humanos: são estes que não conseguem enxerga-la apesar de terem sidos dotados desta potencialidade pelo Criador.
— É mesmo?
— Infelizmente sim. E esta tão meiga, bela e perfumada flor responde pelo lindo nome de Caridade.”


Quando o caboclo acabou de me contar esta história, eu não pude conter toda a dor e tristeza que carregava dentro de meu ser e, sem me preocupar com quem estivesse ao redor no terreiro, desandei a chorar. Chorava tão intensamente que chegava mesmo a soluçar.
E o narrador de toda a história, o Senhor Caboclo das Sete Pedreiras, ao perceber a externalização de meu pranto tão sentido segurou as minhas mãos, olhou fundo nos meus olhos e disse:
— Chore filho, não se envergonhe, desabafe toda a sua dor, transforme em lágrimas todo o seu pesar. Sinta como elas irrompem de dentro de ti e escoam por sua face como se fossem lavas incandescentes saídas de um vulcão. Não seja tímido ao colocar essas lágrimas para fora: sinta a essência do fogo divino que há dentro de você e imagine esse fogo santo purificando a sua alma de todas as tristezas decorrentes de sua situação de desemprego.
Após pronunciar estas últimas palavras o Senhor Caboclo ainda esperou alguns minutos até que minhas emoções serenassem por completo, para depois prosseguir:
— Muito bem filho, esse caboclo gostou de ver toda a sinceridade dos sentimentos do filho não só para falar, mas principalmente para chorar, por que até mesmo para chorar também tem que se ter extrema sinceridade para com Deus.
— Se o Senhor está dizendo eu acredito e agradeço.
— Pode acreditar filho; só não se esqueça de jamais desacreditar, primeiramente, que o Divino criador sabe de todas as coisas e, posteriormente, em suas próprias forças pois até mesmo em suas próprias forças Deus está presente haja visto que você é, como todo ser humano, um templo vivo de Deus.
— Sim Senhor.
— Este caboclo contou esta história para você com o objetivo de que você possa sempre encontrar forças para continuar trabalhando em favor do próximo e da caridade sem se preocupar com o peso da sua cruz. Procure trabalhar a favor do bem ao próximo e a você mesmo, pois só assim você receberá tudo de volta e em dobro. Entenda que o peso da sua cruz, no momento aumentado pelo seu problema de desemprego, é similar ao peso da cruz de muitos outros milhões de seus irmãos por paternidade Divina, que se encontram na mesma situação que você, tanto aqui no país onde você atualmente está encarnado quanto ao redor do mundo. Continue a fazer a caridade que sua hora vai chegar e isto não é promessa, é merecimento!
— Sim Senhor, eu lhe agradeço muito pelas palavras amigas e, principalmente, pela história.
— Este caboclo é que lhe agradece pela oportunidade que você está lhe dando de mais uma vez praticar a caridade e ir buscando a evolução.
— O senhor me permitiria lhe fazer mais duas perguntas.
— Seja breve filho por que a gira está para terminar.
— Primeiramente eu gostaria de saber se o senhor, por acaso, é o pastor de ovelhas da história que acabou de narrar para mim.
— Filho não perde a curiosidade, não é filho?
Devo dizer que fiquei absolutamente desconsertado e mesmo antes que eu o respondesse, ele retomou a palavra:
— Este caboclo não está brigando com você não, filho. Caboclo pede apenas que, para você achar a resposta, utilize o raciocínio e o bom senso.
— Sim Senhor. A outra pergunta que eu queria lhe fazer é se a história que o Senhor me contou é verídica?
— Certamente filho, ela serviu, inclusive, como inspiração para um filho de fé, alguns tempos atrás, criar um ponto de umbanda na linha de Xangô que é muito cantado nos terreiros.
E antes que eu lhe fizesse mais uma pergunta extra que já estava fomentando em minha mente ele, já se levantando e quase indo na direção do Gongá, me disse:
— Já sei até que pergunta o filho quer me fazer e eu lhe respondo pedindo que fique até o final da gira por que hoje, “inusitadamente”, o sacerdote ao invés de encerrar a gira cantando os pontos habituais, será inspirado “ não sei por quem” ( e ao dizer isto eu pude observar, no canto direito de sua boca, o esboço de um sorriso ) a cantar o ponto ao qual se refere a história que eu lhe contei.
E assim eu, ainda de boca aberta pelo fato Dele ter adivinhado a pergunta, pude ouvi-lo me endereçar uma última mensagem.
— Fique na força e na luz de Tupã nosso pai, Ele que lhe dê forças e lhe abençoe em sua jornada, a carregar sua cruz e a fazer a caridade.
Fiquei então esperando a gira acabar, mas de repente, quando dei por mim, estava acordado, deitado em minha cama e com a bexiga quase a explodir. Levantei-me, então, para esvaziá-la bastante aborrecido por ela não ter me permitido ficar na gira até o final.
Deitei-me e dormi de novo, só que desta vez não sonhei com mais nada. Inclusive, durante este segundo sono, para meu desespero, havia esquecido até o que havia sonhado antes.
A única coisa que posso dizer é que, ao me levantar de fato, na manhã seguinte, apesar de nem me lembrar que havia tido um sonho naquela noite, um ponto, estranhamente, não saiu de minha cabeça por todo aquele dia.
É um ponto que diz assim:


Eu estava nas pedreiras
conversando com Xangô,
Disse ele, à sua maneira,
Só se vence com amor.

Com amor se pratica a caridade,
com amor se alivia um coração,
com amor se conhece a verdade,
só o amor é que nos trás consolação.












Salve divino pai Olorum!!!!!!
Salve Pai Xangô!!!!!!
Salve as pedreiras!!!!!Salve o Senhor Caboclo das Sete Pedreiras!!!!!!!




Escrito sob inspiração mediúnica por Pedro Rangel Telles de Sá.


Ass: Caboclo Horácio.

quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Em desenvolvimento.

Certo dia estava fazendo um relaxamento vespertino à beira-mar quando, lá pelas tantas, ouvi alguém indefinido solicitando que eu relaxasse ainda mais porque estava prestes a participar de uma gira de desenvolvimento.
Eu já ia perguntar como isto seria possível sem eu ao menos sair de onde estava quando me lembrei que isto já acontecera anteriormente e pus-me a relaxar com maior intensidade.
Ainda ouvi este “alguém indefinido” a me dizer que para eu encontrar o terreiro onde aconteceria a gira deveria demonstrar bastante segurança e fé e não entendi bem o porquê até me encontrar no meio de um intenso nevoeiro que não me permitia enxergar um palmo diante do nariz; mas não desanimei e continuei a procurar o terreiro indicado.
Somente após alguns minutos foi que lembrei do fato do “alguém desconhecido” não ter mencionado o nome do terreiro onde ocorreria a gira. Este fato, aliado ao intenso nevoeiro ao meu redor, fez com que a angústia dentro de mim aumentasse terrivelmente e eu pude notar que quanto maior se tornava a minha angústia mais a névoa se condensava e impedia a minha visão.
Foi só ai que me lembrei das palavras do “alguém desconhecido” no que diz respeito à necessidade da fé e da segurança para encontrar o local indicado. Assim eu me sentei no terreno onde me encontrava, fechei os meus olhos e fiz uma fervorosa prece ao Divino criador com toda a fé e segurança de que Ele me levaria ao local indicado.
Por quanto tempo fiquei nessa posição eu não saberia dizer, só sei que quando senti a umidade diminuir intensamente ao meu redor abri os olhos e vi que estava impressionantemente em frente a um terreiro onde um Senhor caboclo me saudava e pedia que eu entrasse naquela casa de caridade; fiz então o que me foi solicitado pelo irmão do plano maior, mas não sem antes ficar muitíssimo impressionado com tamanho e vigor dos sentinelas que estavam a guardar aquele templo religioso.
Entrei então no terreiro e descobri que aquele irmão que estava a me saudar no portão de entrada era o “alguém indefinido” que fizera com que eu me desdobrasse até ali e que, na verdade, se chamava Senhor Caboclo Beira-mar.
Quando entrei no templo percebi que a Entidade chefe estava realizando uma palestra introdutória e preparatória para o momento da incorporação que ocorreria em breves instantes naquela gira de desenvolvimento. O Senhor Caboclo Beira-mar solicitou-me, então, que eu me pusesse a observar circunstâncias que se repetiam em alguns membros do corpo mediúnico que tinham a mediunidade de incorporação.
Percebi então que realmente, com certos membros do templo com esta referida mediunidade, uma incrível coincidência realmente acontecia: o chacra frontal destes médiuns estava parcialmente revestido com uma estranha coloração violeta e eu com minha conhecida vontade de aprender e curiosidade perguntei ao Senhor caboclo Beira-mar o porquê daquela “coincidência”.
— Bem companheiro a coloração violeta envolvendo o chacra frontal de cada médium que você observou representa a irradiação da divina falange dos pretos-velhos para que a energia da transmutação envolva os seus mentais e possa transformar os seus medos em segurança mediúnica.
— Medo? Como assim?
— Medo companheiro, simplesmente medo; ou você já esqueceu do início de seu desenvolvimento mediúnico há alguns anos?
— Medo? Mas medo de que?
— De que você tinha medo no início de seu desenvolvimento mediúnico?
— Bem, eu tinha insegurança muitas vezes por não saber, enquanto a Entidade estava incorporada, se a incorporação havia mesmo ocorrido ou se era eu que ali estava a estalar os dedos.
— Ou seja, companheiro, você tinha o medo de estar cometendo o erro do animismo voluntário, certo?
— Sim Senhor.
— Você possuía algum outro tipo de medo, companheiro?
— Sim senhor, lembro de que quando a entidade estava a comunicar algum fato com alguém, por dentro eu morria de medo querendo entender se quem falava e o que era falado eram provenientes do meu desejo de falar ou do trabalho da entidade.
— Ou seja, você estava temeroso de estar cometendo o erro da mistificação, não é verdade?
— Sim senhor.
— Você ainda possuía algum outro tipo de medo na época do início de seu desenvolvimento, companheiro?
— Sim senhor. Eu me recordo que por várias vezes não firmava o pensamento para auxiliar a entidade que estava incorporada na realização de seus trabalhos por que, justamente devido aos receios anteriores que eu Lhe-disse, estava com medo do corpo mediúnico achar que na verdade a entidade não estava incorporada coisa alguma.
— Ou seja, você estava com medo do julgamento alheio, correto?
— Sim senhor.
— Pois então companheiro, estes, entre outros, são os medos que você pôde observar em alguns médiuns do corpo mediúnico deste templo em que se encontra e que explicam o porquê do chacra frontal dos mesmos estarem envolvidos com uma coloração violeta. Na verdade, companheiro estes medos são comuns e até mesmos freqüentes no início do desenvolvimento mediúnico de qualquer médium, a não ser que este seja portador da raríssima mediunidade da psicofonia inconsciente.
— O senhor então quer dizer que no início do desenvolvimento mediúnico de todo médium este tem o seu chacra frontal envolvido por uma coloração violeta, é isso?
— Não. Os médiuns que você pôde observar no dia de hoje têm o seu chacra frontal envolvido por esta coloração violeta porque os seus medos já se tornaram por demais exarcebados e esta coloração irradiada pela falange dos preto-velhos ai está, antes da incorporação, como lhe disse anteriormente, para que os medos destes médiuns possam ser transmutados em fé no Divino criador e segurança mediúnica, entendeu?
— Sim senhor.
— Entenda que para a névoa que encobre a fé e a segurança mediúnica de todo médium iniciante, no desenvolvimento de sua mediunidade, seja dissipada é vital que estes procurem constantemente sanar as suas dúvidas e ter a humildade de dar tempo ao tempo para que as entidades incorporantes possam aos pouquinhos passar os seus conhecimentos e formas de trabalho. Entendeu a questão da névoa, da fé e da segurança mediúnica?
— Sim senhor.
— Então observe nesta gira um ou outro fato que você veja alguma relevância por que já está quase na hora de você retornar ao corpo físico.
— Mas já Senhor Caboclo Beira-mar, hoje eu não vou poder ficar até o fim da gira?
— Não companheiro, entenda que ordens são ordens e eu tenho que cumpri-las.
— Sim senhor, eu entendo perfeitamente.
— Assim, então, é meu dever lhe informar que assim que se iniciar a incorporação das entidades nesta gira de desenvolvimento, onde também estou incluído, você terá que retornar ao seu corpo carnal.
— Sim senhor, mas parece que as incorporações estão prestes a começar por que eu já estou vendo todas as Entidades já próximas de seus médiuns, não é verdade?
— Sim, é como lhe disse, faltam poucos instantes para você retornar ao corpo físico.
E quando o Senhor Caboclo Beira-mar acabou de pronunciar esta frase uma chuva torrencial de multicores veio do alto e banhou a todos os médiuns e Entidades que estavam na fila do desenvolvimento; a partir desta ocorrência eu observei que nos olhos de cada Entidade havia o brilho de uma lágrima que teimava em não cair de suas faces.
Virei-me então em direção ao Senhor Caboclo Beira-mar para perguntar o motivo desta ocorrência e na hora que eu observei que Ele era a única Entidade no terreiro com duas lágrimas nos olhos fiquei mais intrigado ainda.
Antes que eu abrisse a boca Ele, como se lesse o meu pensamento, veio em meu socorro e passou a me explicar:
— Companheiro, saiba que em toda reunião umbandista de desenvolvimento mediúnico, após a chuva multicor de bênçãos energéticas direcionadas aos médiuns, gerada pelo Criador e observada por você, surge, instantes antes da incorporação, no olhar de cada entidade, o brilho de uma lágrima que reflete a alegria incondicional de cada uma delas tanto por poderem estar servindo à Deus, quanto por estarem auxiliando a seus respectivos médiuns em seus desenvolvimentos e sendo ajudados por estes através da fé e da segurança mediúnica de cada um.
— Puxa, que coisa linda!!!
— A umbanda é que é linda, companheiro.
— Com certeza a umbanda também é linda, mas agora estou observando que as incorporações vão mesmo começar e eu gostaria de Lhe fazer uma última pergunta, posso?
— Tem que ser mesmo a última, companheiro.
— Sim senhor, é que nos olhos de cada entidade eu vi uma lágrima e eu gostaria de saber por que só na Vossa face eu vejo o brilho de duas lágrimas.
— Companheiro, você viu bem, mas na verdade apenas uma dessas lágrimas é minha.
— Verdade?
— Sim, a outra eu faço doação para você por dois motivos: o primeiro reside no fato que tenho fé no Criador que hoje você vai desenvolver bem a sua dose diária de fé e segurança mediúnica, já o outro motivo é para que você possa transformá-la em um ponto cantado umbandista que retrate tudo aquilo vivenciado por você no dia de hoje. Adeus companheiro fique na força e na luz de Tupã, nosso pai!!!
E dito isto, para meu desespero, o Senhor Caboclo Beira-mar foi embora e me deixou completamente inquieto porque, afinal de contas eu não sou compositor, cantor e nunca fiz um ponto umbandista em toda minha vida, então, como Ele disse que eu faria o ponto?
Comecei a ficar nervoso, inquieto, impaciente e nada do referido ponto vir a minha cabeça. Já estava começando a pensar que o sol havia torrado minha cabeça e que havia sido acometido por algum tipo de processo alucinatório.
Foi então que repentinamente uma densa névoa começou a ser formada na beira da praia e eu pude perceber o brilho de apenas uma lágrima em meu olhar, fechei os olhos então, pedi perdão a Deus por minha intolerância e comecei a fazer uma prece pedindo-O que a cada dia desenvolvesse minha fé e segurança mediúnica e foi só dessa forma que eu pude escutar de algum lugar, mas como se estivesse vindo de dentro de minha alma, um ponto que diz assim:




Caboclo solta o brado
Que a chuva já molhou.
A chuva esconde o pranto
de alegria que pingou.

O pingo é o brilho
da luz do Criador.
O choro é a alegria
dos caboclo que chegou.










Salve Deus pai todo-poderoso!!!
Saravá ao Senhor caboclo Beira-mar!!!
Saravá a gira de desenvolvimento!!!



Ass: Um amigo espiritual.



Escrito sob inspiração mediúnica por Pedro Rangel Telles de Sá.

terça-feira, 2 de outubro de 2007

Nêga Véia e a velhice verdadeira


Suncês que vivem na carne neste mundo de terra costuma ser extremistas e classificadores.
Se um fio só pratica virtudes e apenas tem atitudes fraternas para com o próximo e com a vida suncês classifica estes zifios na categoria do bem.
Se os fios só põe em prática os seus vícios e tem atitudes egoístas para com os outro, suncês classifica estes zifios na categoria do mal.
Os zifios da categoria do bem são aqueles que suncês chama de fios bons.
Os zifios da categoria do mal são aqueles que suncês chama de maus.
Mas será que existe aqueles zifios que são somente maus?
Será que existe aqueles zifios que são somente bons?
Suncês se alembra que tá escrito lá na bíblia que o “homem grande da cruz” recusou ser classificado de homem bom? Lembra quando ele disse que bom mesmo só o pode ser considerado Zambi nosso pai?
E o mestre Jesus zifios nunca que praticou uma só atitude que pudesse classificá-lo como um homem mau, então, porque Ele não quis que o chamassem de homem bom?
Nêga Véia não sabe de muita coisa não, mas acha que é porque Ele mesmo quis se fazer de exemplo para que suncês nunca fossem extremistas e classificadores em relação ao próximo.
Nêga Véia fala que a classificação que suncês usa pra dizer quem é bom e quem é mau só serve pra que suncês saibam por onde andar com segurança neste vasto mundo de terra, entretanto zifios suncês não deve usar essa classificação com gestos e atitudes extremistas buscando segregarem-se dos homens maus como se só eles fossem doentes da alma e suncês fossem totalmente sãos de virtudes.
Se o mestre Jesus quisesse que suncês agisse desta forma Ele, quando esteve na carne, não teria passado boa parte da existência junto dos homens maus, não é verdade?
O mestre Jesus viveu entre prostitutas, doentes, malfeitores e até quando estava pregado no madeiro para morrer teve por companhia a presença de dois ladrões que também se encontravam crucificados e suncês sabem por quê?
Nêga Véia fala que é porque Jesus sempre soube que o bem e o mal sempre formou os dois lados que compõe o rosto de Zambi nosso pai, pois ninguém é capaz de alcançar as esferas do bem se não expurgar todo o mal que existe dentro de si auxiliando o próximo a também agir desta forma, assim como ninguém é capaz de trabalhar por Zambi servindo a Sua lei e Sua justiça nas trevas se não tiver em seu coração o Divino conceito do bem a lhe guiar na jornada.
Bem e mal são os dois lados da face de Deus e é por isso que Nêga Véia pede que suncês tomem muito cuidado com a classificação extremista que suncês fazem do próximo por que isto afasta suncês uns dos outros e da essência divina que existe dentro de suncês.
Nêga Véia dá um exemplo pra suncês: muitos zifios ou olham pros velhinhos deste mundo terra classificando-os enquanto sábios e humildes ou olham pra eles classificando-os como merecedores de extrema pena e compaixão por causa da saúde deles.
Estes zifios classificam os velhinhos desta forma não por conhecimento de causa, mas tão somente pelos anos de vida que estes velhinhos possuem, ou seja, por classificar a velhice em atitudes extremas.
Nem todo velhinho deste mundo de terra fica sábio e humilde apenas pelas várias décadas de existência que repousam pelos seus ombros e nem todo velhinho tem a sua saúde debilitada apenas porque os anos passaram em sua vida.
Existem muitos zifios que suncês chamam de jovens, mas que Nêga Véia fala que se encontram muito mais ranzinza e desesperançado que muito velhinho deste mundo de terra, pelo contrário também existem muitos zifios com menos de duas décadas de vida que tem uma sabedoria infinitamente superior a muitos velhinhos deste mundo de terra.
Na verdade zifios a pele enrugada, os cabelos brancos e o andar vagaroso não deve fazer com que suncês classifiquem um ser humano idoso como velho.
Velho, zifios, são as pessoas deste mundo de terra, independente da idade, que não são humildes, caridosos, abnegados, batalhadores e esperançosos. Nêga Véia fala que esses fios em especifico é que são velhos por que são essas atitudes que, com o passar do tempo, fazem com que esses filhos percam a capacidade de amar a Deus, ao próximo e, infelizmente, a si mesmos, envelhecendo, assim, as suas mentes, suas emoções e seus espíritos: estes sim são os verdadeiros velhos realmente dignos de compaixão.
Sábio é aquele zifio que desde jovem vai se preparando pra que o envelhecimento na terra não o torne um velho de espírito, pois aquele que tem o espírito jovem será eternamente jovem e terá sempre a consciência de que: a pele enrugada é a armadura de que Zambi o dotou para enfrentar a “guerra” do preconceito, os cabelos brancos formam o capacete com que Zambi o presenteou para que mantenha sempre a mente jovem e o andar vagaroso é o reflexo daqueles que aprenderam a desenvolver verdadeiramente a perfeição a tal ponto de saber que não precisam se apressar tanto para se chegar a um determinado lugar, pois sabem que tem o tempo ao seu favor e que a pressa é inimiga do tempo e da perfeição.
Procurem não ser extremistas zifios, procurem, antes, a sabedoria, a perfeição e a humildade.
Que zambi abençoe a todos suncês que tão fazendo esforço pra ler estas palavras que Nêga escreve num português tão imperfeito, que suncês perdoe a Nêga e que as palavras possam alcançar a mente e o coração de suncês para que possam buscar desenvolver a perfeição que realmente importa aos olhos de Zambi e que não é a perfeição das letras, mas sim a do desenvolvimento das virtudes!!!
Que Zambi abençoe a todos suncês que são jovens de corpo com o equilíbrio e a humildade que possam torná-los, com o passar do tempo, velhinhos na carne e jovens de espírito, ou seja, eternamente jovens!!!
Que Zambi abençoe a todos os velhinhos que se encontram nos asilos e aqueles que se encontram desamparados!!!
Que Zambi abençoe a todos os velhinhos deste mundo de terra!!!!
Fiquem na força e na luz de Zambi nosso pai!!!!!


Saravá a Deus nosso pai!!!
Saravá a Divina falange dos pretos-velhos!!!
Saravá a sabedoria e a humildade!!!
Saravá ao dia-a-dia, pois todo dia é dia do idoso!!!



Ass: Um amigo espiritual.




Escrito sob inspiração mediúnica por Pedro Rangel Telles de Sá

sexta-feira, 21 de setembro de 2007

A história de Indaiara


Este texto é uma homenagem à alma feminina de todo ser humano.



Há muitos e muitos séculos havia uma jovem de dezoito anos que vivia em uma enorme aldeia.
Era órfã de mãe e tinha sete irmãs e três irmãos, todos mais velhos que ela.
Desde a mais tenra idade aprendera com o pai a manipular a energia das ervas e, com o passar do tempo, passou a desenvolver esta atividade com maestria. Sabia utilizar a energia das ervas com qualquer finalidade: banhos, chás, ungüentos, fumos e limpeza energética.
Em termos físicos pode-se dizer que ela não era nenhuma beldade, mas sua simpatia, seus cabelos negros e sedosos, seus enormes olhos esverdeados e seu intenso magnetismo pessoal eram suficientes para torná-la uma mulher inebriante.
Mesmo, ainda, sendo tão jovem a sua fama de curandeira já havia se espalhado por longas distâncias e até mesmo membros de aldeias distantes vinham se consultar com ela.
Entretanto, apesar de seu precioso dom, Indaiara não se sentia feliz. A causa de sua infelicidade era o fato de ainda não ter encontrado o amor.
Indaiara possuía uma visão idealista do amor: em seu modo de ver o amor era algo que, uma vez encontrado, traria a felicidade eterna não importando quais situações pessoais estivesse passando em sua vida tais como fome, enfermidades, etc.
Na realidade, ela estava muito preocupada pelo fato do tempo estar passando (era comum naquelas épocas as mulheres contraírem laços matrimoniais com no máximo quinze anos) e ela ainda não ter encontrado o idealizado amor.
Ela já havia sido cortejada anteriormente e convidada a ser casar por pelo menos meia dúzia de vezes, mas como não via nestes pretendentes a figura do amor, acabara declinando de todos os convites. Suas irmãs, todas casadas, ainda procuravam conversar com ela tentando explicar o fato de que, muitas vezes, o afeto acaba vindo com o tempo, mas ela dizia que não queria afeto e sim amor.
Mas o tempo foi passando e ela já aos dezoito anos ainda não havia encontrado o amor e este fato, muitas vezes, provocava em Indaiara uma tristeza tão intensa que ela sentia vontade de dar um fim à própria vida.
O tempo correu três anos e Indaiara já não utilizava o seu dom de curar através das ervas com a mesma satisfação, alegria e prazer de antes. Não agüentando mais a sua própria frustração por ainda não ter encontrado o amor ela, aproveitando o momento das trocas de mercadorias entre sua tribo e os homens de pele branca conhecidos como cara-pálidas, acabou se infiltrando dentro de uma embarcação.
O capitão daquela embarcação ao encontrá-la ainda tentou dissuadi-la e convence-la a retornar para sua tribo, mas ela com seu jeito faceiro e sedutor conseguiu faze-lo desistir de seu intento prometendo que faria tudo que ele quisesse e se insinuando com intenções claramente sensuais.
Indaiara não sabia o porquê de ela ter agido desta forma, mas tinha o propósito firme de querer conhecer outras partes do mundo e descobrir, por conta própria, se nelas acabaria encontrando o tão idealizado amor.
Indaiara era o braço direito de seu pai e seu motivo de maior orgulho por que fôra a única de suas filhas que se interessara pelo trabalho com as ervas e é desnecessário dizer que, seja pela idade avançada ou pelo desgosto do desaparecimento dela, alguns poucos meses depois de sua fuga ele veio a desencarnar.
Inclusive, na mesma noite em que desencarnou o seu pai veio a ter com ela no momento do sono físico para dizer que não poderia alcançar a morada de seus ancestrais sem rever, ainda que fosse por pelo menos uma única vez, a sua filha querida. Indaiara, inclusive, assustou-se tão imensamente com este sonho que acabou por perder o sono pelo resto da noite.
Na realidade, este não era o único motivo de sua insônia: Indaiara ainda não sabia, mas estava grávida de cinco meses e os enjôos conseqüentes desta, principalmente no período noturno, também estavam contribuindo muito para sua insônia.
Quando estava com sete meses de gestação Indaiara encontrava-se imensamente triste por não saber o que fazer diante daquela situação, pois faltavam poucos dias para a embarcação aportar em uma terra que futuramente seria conhecida como Espanha, e ela ter a convicção plena de que não poderia ficar com a criança naquele momento por acreditar que não conseguiria lhe ofertar de forma plena um sentimento que ela mesma ainda não havia conhecido: o amor.
Conversou, então, com o pai da criança, que era o capitão do barco, e ao expor suas incertezas ele, um homem duro e frio, riu cruelmente da aflição dela e depois explicou que se ela não quisesse filhos que não deveria nem ter entrado no barco e que se ela houvesse retornado para sua aldeia, quando ele solicitou a ela que assim procedesse, ela também não estaria grávida.
Disse ainda que se ela não quisesse pagar por sua passagem para conhecer novas terras através do sexo ela também não estaria nessa situação. E somente após manifestar as suas opiniões foi que ele lhe pediu que não se preocupasse com o bebê porque este seria vendido como escravo.
Indaiara não esboçou uma reação sequer, com exceção do fato de clamar a ele que lhe permitisse deixar pelo menos uma lembrancinha para a criança a fim de que esta, de alguma forma, nunca esquecesse de sua mãe. O capitão aquiesceu ao pedido sem colocar nenhum empecilho e Indaiara ficou a pensar que presente ofertaria à sua filha.
Ao aportar no cais, o capitão da embarcação levou Indaiara grávida para casa e tornou-a cativa sua até o nascimento do bebê.
Na noite que precedeu o nascimento do bebê, Indaiara teve um sonho simbólico onde uma dama que irradiava intensamente uma claridade na cor rósea pedia que marcasse o braço direito de sua filha, como era costume em sua aldeia, com o símbolo de sua descendência.
Indaiara despertara no dia seguinte com as contrações do parto que, por sua vez, aconteceu naturalmente.
Após o nascimento da criança o capitão quis que Indaiara fosse imediatamente embora de sua residência, mas ela, de tanto implorar, conseguiu arranjar sua permanência na casa por mais alguns dias com o argumento de que seu leite seria de extrema importância para a sobrevivência da criança pelo menos nas primeiras semanas.
Um mês e meio após esta conversa, na calada da noite, Indaiara invadiu sorrateiramente o quarto do bebê e marcou o braço direito dela, ainda tão pequenino, com o símbolo de uma meia lua. Com esta atitude a criança começou a chorar intensamente e Indaiara teve que fugir daquela residência para não ser castigada ou até mesmo morta; a marca de meia-lua no braço de sua filha ficaria como um presente que o próprio capitão houvera consentido que ela lhe ofertasse.
Mas, por favor, não pensem que Indaiara sentira terrivelmente em seus sentimentos pelo fato de ter abandonado sua filha!!Indaiara, meus irmãos, queria encontrar o tão idealizado amor e, em suas idéias, somente após o acontecimento deste fato, ela teria condições de amar a sua filha ou qualquer pessoa da forma que estes realmente merecessem.
O capitão da embarcação ficou enormemente aborrecido com a marca que Indaiara deixara no bebê porque, ao contrário do que havia dito a ela na embarcação, ele não venderia o bebê como escravo; e esta mudança em sua atitude ocorrera no momento exato em que a criança veio ao mundo e ele por ela apaixonou-se perdidamente à primeira vista.
Manuela, este foi o nome que o capitão resolveu colocar em sua filha, crescia em beleza, estatura, inteligência e formosura a cada ano que se passava, entretanto uma pergunta jamais saia de sua cabeça apesar dos esforços enormes com que seu pai fazia para que isto acontecesse: quem era sua mãe?
Ao completar sete anos de idade seu pai teve que castiga-la brutalmente quando ela pedira a ele que lhe desse de presente a identidade de sua mãe. Este fato fez com que ela nunca mais perguntasse a seu pai qualquer fato relacionado à sua genitora, entretanto, ela nunca retirou esta dúvida de seu coração; aliás, esta dúvida aumentava terrivelmente a cada dia.
No dia em que completaria dezoito anos de idade Manuela teve a idéia de fugir de casa e deixar um bilhete dizendo que só retornaria ao lar se o seu pai estivesse disposto a falar sobre o paradeiro de sua mãe, pois Mercedes, a sua velha ama-de-leite, ficaria com a incumbência de observar os efeitos de sua partida na vida de seu pai e de levá-lo até ela, como se a tivesse visto casualmente, caso este resolvesse contar-lhe a verdade.
O coração do pai de Manuela, capitão de uma embarcação e rico mercador, ficara em pedaços com seu desaparecimento, mas o que ele não imaginava era que ela estivesse tão próxima de si e vivendo no sótão de sua própria residência.
Três dias após a “fuga” de Manuela, o seu pai e nove dos dez capangas que tomavam conta de sua fazenda foram fortemente armados ao encontro dos prováveis raptores de sua filha, segundo pista que recebera.
Apenas um capanga ficou de tocaia para tomar conta da residência de seu chefe e como já passava das vinte horas Manuela resolvera descer do sótão e ir de encontro a Mercedes para tentar descobrir o que estava acontecendo. Mercedes, por sua vez, contou a ela tudo o que ocorrera e Manuela, temendo pela vida de seu pai, pela primeira vez, arrependeu-se do plano que arquitetara.
Enquanto as duas conversavam ouviram o estampido de um tiro e, assustadas, foram olhar pela cortina da sala para ver o que estava acontecendo e o que viram não foi nada agradável: os homens de Alfredo, terrível inimigo de seu pai, aproveitavam a pouca vigilância da casa e a estavam invadindo para concretizar a ameaça que este fizera ao seu genitor meses atrás de destruir-lhe a casa e violentar, para depois matar, toda sua família.
Mercedes e Manuela tentaram escapar, mas foi inútil, pois em poucos instantes elas foram capturadas, amordaçadas e colocadas em uma carruagem que tomava a direção de uma extensa floresta.
Manuela ainda fez um tremendo esforço para levantar sua cabeça e olhar para trás, mas o choque ao ver a residência onde nascera e fôra criada ardendo em chamas foi tão intenso que ela desmaiou.
Assim que despertou Manuela viu uma cena que a deixou horrorizada: todos os seus algozes, cerca de quinze homens incluindo o próprio Alfredo, revezavam-se como animais na violação do corpo de sua ama-de-leite, uma senhora de quase setenta anos. Manuela gritava e procurava agredir os seus raptores verbalmente, mas calou-se em um silêncio estarrecedor quando eles lhe disseram que não se preocupasse porque ela seria a próxima a ser “devorada”.
Lágrimas pesadas e copiosas rolavam por sua face quando ela viu Mercedes cair morta no chão e os homens ensandecidos virem em sua direção, entretanto, antes que começassem a praticar os seus atos de selvageria, os algozes de Manuela observaram um homem a galopar com toda a velocidade em sua direção; assim foi que saíram completamente nus a correrem para pegar as suas armas, mas desistiram ao verificarem que o cavaleiro em questão também fazia parte do bando.
Ofereceram, então, uma boa dose de vinho ao seu comparsa e disseram que ele chegara numa hora boa porque haviam deixado o “prato principal” para o final. Ele, assim, olhou na direção de Manuela e passou a língua vagarosa e repetidas vezes pelos lábios num claro sinal de aprovação a satisfação vindoura de seu apetite sexual desequilibrado.
Mas os seus comparsas chamaram-no de volta a realidade quando perguntaram como havia sido a armadilha.
Só foi escutar esta última palavra para Ricardo, este era o nome dele, começar a narrar toda a arapuca sangrenta: aconteceu tudo como esperávamos. O capitão, paizinho desta coisinha saborosa que está à nossa frente, e os seus homens ficaram loucos quando souberam da pista falsa, plantada por nós, de que sua filha estaria sendo mantida como refém na companhia de quatro malfeitores em uma velha casa abandonada e quando nós ficamos sabendo que hoje ele iria até lá com seus homens no intuito de resgatá-la foi muito fácil armar uma tocaia e acabar com a vida de todos no coração da floresta; e vocês, cumpriram com o combinado?
— Mas é claro, respondeu Alfredo, matamos o capanga que vigiava a residência do capitão, incendiamos toda a casa e matamos a negra maldita que vivia naquela casa como se fosse branca.
— Então vamos completar o serviço, propôs Ricardo?
Desnecessário seria dizer que todos concordaram aos urros e partiram como animais na direção de Manuela. Esta, por sua vez, ao ouvir toda a trama macabra e descobrir que, além de seu antigo lar não existir mais, não saber o paradeiro de sua mãe, ver sua ama-de-leite e melhor amiga violentada e assassinada, o seu pai também estava morto perdera, como por encanto, o interesse por sua própria vida.
Alfredo, Ricardo e todos os demais malfeitores usufruíram dos prazeres de violentar um corpo imaculado e puro, mas que também, por todos os motivos expostos, encontrava-se inerte como se fosse um boneco.
Os capangas revezavam-se em seu sexo como se fossem animais possuídos pelos mais animalescos Entes trevosos até o momento em que Manuela, sentindo uma terrível falta de ar e um aperto no coração, desmaiou como se estivesse morta.
Ao se verem diante desta situação e julgando que Manuela estava morta os capangas, terrivelmente contrariados pela interrupção em seu momento de prazer, arrastaram o seu corpo até as imediações de um precipício e o deixaram lá como banquete a fortuitos animais famintos.
Somente após tomarem estas providências foi que os malfeitores foram embora.
Por volta das quatro horas da manhã, sentindo uma terrível dor em seu sexo e sem a mínima disposição para continuar vivendo Manuela procurou levantar-se e, andando vagarosamente, devido às dores em seu corpo, jogar-se precipício abaixo.
Faltavam aproximadamente dez passos para chegar à beira do precipício quando os gritos de uma mulher chamaram sua atenção e fizeram com que olhasse para trás: era uma mulher com o corpo marcado precocemente pelas marcas do tempo e que vestia-se como se fosse uma prostituta.
Manuela, assustada, pensando que se tratava de alguma ladra deu, de costas, mais dois passos em direção ao precipício.
— Por favor, pare!! Eu não vou fazer-lhe nada de mal, disse a mulher mal-vestida.
— Como assim não vai me fazer mal? Você é uma prostituta!
— Sou uma prostituta, mas não sou malfeitora!!!!
— Até parece que existe diferença.
— Escute moça, estou vendo que você está com vestes rasgadas e ensangüentadas; penso que você deve ter acabado de passar por uma situação terrível e que por isso é que deve estar emocionalmente tão abalada. Estou certa?
— Sim, você está certa. Vários homens defloraram meu corpo e minha honra como se fossem animais.
— Eu, como ninguém, posso precisar o tamanho de sua dor, mas creia-me: isto não é motivo para você tirar sua própria vida.
— Concordo com você.
— Mas tenho a impressão que você estava a caminhar para a beira do precipício com intenção de se jogar daqui de cima.
— Eu realmente quero fazer isso que você disse, mas não porque me violentaram e sim porque acabaram com todo o meu amor! Eu não tenho mais motivos para viver!
— Como assim acabaram com todo o seu amor?
— Os mesmos animais que me violentaram também destruíram o meu lar, violentaram e mataram minha melhor amiga e assassinaram o meu pai depois que lhe armaram uma armadilha. Diga senhora prostituta, e Manuela dissera essa frase em tom irônico, como poderia querer viver se não tenho ninguém mais para amar, se não tenho mais amor?
— Moça, acredite quando eu lhe digo que não sei onde está o amor, mas que sei que certas atitudes que tomamos na vida muitas vezes podem eliminar toda e qualquer possibilidade de o encontrarmos um dia.
Manuela notou que a mulher a sua frente, apesar de ser de vida fácil, tinha uma estranha sabedoria e, somente por causa desta sua observação, foi que resolveu lhe perguntar:
— Porque você está me dizendo isto?
— Porque há quase vinte anos acho que tive o amor bem próximo a mim, entretanto por não conseguir enxerga-lo, não lutei com todas as minhas forças para que não o levassem de mim.
— Você está falando de quem? Um amante?
— Não. Estou falando de minha filhinha.
E, dizendo esta frase, a prostituta desandou a chorar. Chorava com um pranto tão profundo e sentido que Manuela resolveu dela se aproximar.
— Mas o que foi que houve com sua filhinha que seja assim tão irreversível? Você não quer me contar?
A prostituta olhou, então, firme nos olhos de Manuela para só depois responder:
— Só se você sair de vez de perto deste precipício!
— Combinado.
Somente após encontrarem um tronco de árvore caído ao chão para se assentarem foi que a prostituta retomou o diálogo:
— Antes de lhe contar um pedaço de minha história, você poderia me dizer o seu nome?
— Manuela.
— Pois bem Manuela, minha história é a seguinte:
Há quase duas décadas, eu havia acabado de fugir da casa onde fui recebida neste país com o intuito de procurar o verdadeiro amor. Assim é que exatamente nesta época você poderia me encontrar andando perdida pelas feiras em busca de qualquer alimento que pudesse saciar a minha fome.
— Mas e sua filha? Onde ela entra nesta sua história? Não estou entendendo!
— Acalme-se Manuela, minha história começa exatamente no ponto em que eu havia acabado de perder a minha filha.
— Perder sua filha? Porque isto aconteceu?
— Porque eu havia acabado de chegar neste país e não podia fugir com ela nos braços sem ter como nos manter.
— Mas você disse que se arrepende, que seu amor é sua filhinha.
— Eu me arrependo hoje porque a vida ensina muita coisa, mas não me arrependi há quase vinte anos.
— Por favor, prossiga! Creio que estou interrompendo sua narrativa!
A prostituta deixou transparecer o esboço de um sorriso em sua face e depois continuou a sua história:
Então Manuela como eu estava lhe dizendo, há vinte anos eu havia acabado de chegar neste país e acabara de abandonar a minha filha.
Estava morrendo de fome e aproveitei que era dia de feira para ver se conseguia algum alimento. O tempo passava, a minha fome só aumentava e eu nada de conseguir um alimento, até que em uma barraca que vendia queijos e biscoitos caseiros eu percebi que um homem não parava de cobiçar o meu corpo.
Procurei me aproveitar da situação e lhe pedi um pouco de biscoitos ao que ele me respondeu que naquele dia iria me dar alguns biscoitos, mas que se algum outro dia eu quisesse mais alguns eu deveria pagar por eles.
Respondi então ao Carlos, este era o nome dele, que não tinha emprego e ele pediu que às oito horas da noite, em ponto, eu estivesse dentro da taverna, de propriedade dele, no centro daquela cidade e fosse conversar com ele.
Assim eu fiz e posso dizer que não me assustei quando ele me fez a proposta de ser prostituta em troca de um bom trocado. Eu sabia que faria muito sucesso entre os homens por ser estrangeira e, naturalmente, ter um biótipo bem diferente das mulheres deste país.
Posso dizer que realmente estava com a razão porque os homens faziam fila para ter alguns momentos comigo. Era com esse dinheiro que eu pagava alimentação, roupas e o aluguel de onde morava que, por sua vez, era a taberna onde eu tinha os meus encontros.
A vida até que financeiramente não estava tão ruim para mim, acontece que pelo lado emocional eu não poderia responder a mesma coisa, pois havia saído de minha terra em busca do amor e, apesar de já estar vivendo neste país há dez anos, ainda não o havia encontrado.
O tempo foi passando e eu fiquei com uma saudade terrível de minha terra; foi quando eu resolvi começar a juntar dinheiro para futuramente comprar passagem numa embarcação que me levasse de volta a ela.
Posso dizer até mesmo que neste meu trabalho como prostituta eu tive uma relativa dose de sorte porque nunca apanhei ou fui maltratada por cliente algum. Mais de uma dúzia deles, inclusive, pediram que largasse essa vida para ir viver com eles, entretanto como eu não tinha planos de continuar vivendo neste país, declinava dos convites.
Juntei dinheiro por cinco anos e já estava me preparando para comprar a passagem de volta para minha terra natal quando numa noite o bandido do Carlos ao escutar os meus planos, com medo de perder a clientela devido ao grande número de tavernas concorrentes que foram abrindo as portas ao longo dos anos, chamou as autoridades competentes até a sua taverna e acusou-me formalmente de roubo dizendo que todo o dinheiro que eu juntara ao longo de cinco anos dentro de uma mala atrás do guarda-roupa era dele e que eu estava pretendendo fugir do país com todo aquele dinheiro.
As autoridades, obviamente, não iriam dar crédito a uma estrangeira e eu, infelizmente, fiquei sem meu dinheiro e presa por três anos até a noite de hoje.
Também posso dizer que a vida de presidiária não foi de todo tão mal assim, pois foi lá dentro que eu pude reencontrar dentro de mim uma parte que parecia perdida e recomeçar o meu trabalho com ervas.
Preparava banhos, chás, e ungüentos tão eficientes que muitas vezes até as próprias autoridades vinham me procurar em busca de socorro junto às ervas da natureza.
Manuela escutara toda a história da prostituta com muita atenção até que, não agüentando mais de curiosidade resolveu perguntar:
— Você é estrangeira e foi acusada pelas autoridades por roubo e tentativa de fuga, o que você fez para pegar uma pena de somente três anos?
— A minha pena não era de três anos.....
— ....mas então você fugiu!
— Não! Eu fui libertada.
— Como assim?
— Você me permite terminar a história?
— Prossiga, porque eu não estou conseguindo entender!
— Então me permita continuar:
Apesar de estar me sentindo útil na prisão, nada conseguia diminuir a minha decepção por ainda não haver encontrado o amor. Na verdade, eu havia desistido dele e de três meses para cá estava sentindo uma saudade profunda de minha filha. Nas últimas três semanas, por exemplo, eu sonhava praticamente todos os dias com minha filhinha ainda bebezinho sendo segura pelos meus braços e ninada por canções antigas de minha terra natal.
— Por quanto tempo você ficou com sua filha?
— Quarenta e cinco dias.
— E como são essas canções de sua terra?
A prostituta, mesmo sem entender o pedido de Manuela, começou a entoar uma canção que ela mais gostava de cantar para sua filha e, ao chegar ao seu término, buscou o olhar de Manuela e pôde observar que estava banhado em lágrimas, fez-lhe, assim, uma pergunta:
— Porque você chora Manuela?
— Porque esta canção, estranhamente, despertou em mim emoções que eu parecia não sentir a muito tempo. Você me desculpe pela infantilidade e, por favor, prossiga com sua história.
— A emoção equilibrada manifesta na forma de lágrimas não é sinal de infantilidade, mas sim de maturidade. Já no que diz respeito a minha história não se preocupe que ela já está quase no seu fim:
Sonhei tantas vezes com minha filha nesses últimos dias que, sei lá porque, comecei a ver estes sonhos como um sinal de que o amor que eu tanto procurei poderia estar na figura de minha filhinha.
Não conseguia retirar estes pensamentos de minhas idéias até que esta noite, há algumas horas, eu pus-me de joelhos ao chão e clamei ao Divino Criador que me perdoasse pela fraqueza de ter deixado a minha filha escapar de mim e que me permitisse, nem que fosse pela última vez, ao menos vê-la de longe fosse ela escrava em qualquer canto deste vasto mundo. Na verdade, Manuela, naquele momento de oração eu me comprometi com o Divino Criador a encontrá-la onde quer que esteja.
— Mas a sua filha era escrava?
— Até quando eu pude tê-la ao alcance de meus olhos ela não era escrava, entretanto o pai dela me disse que era só uma questão de tempo até ganhar um bom dinheiro com ela no mercado de escravos.
— E o que aconteceu quando você terminou sua prece na prisão?
— Alguém que eu não via há muito tempo reapareceu para mim.
— Quem? A sua filha?
— Não. Uma dama que irradiava intensamente uma claridade na cor rósea.
— Quem?
— Não sei bem ao certo, mas eu acho que deve ser alguma enviada de uma Divindade que cultivamos em nossa terra natal.
— Divindade?
— Sim. A Divina Deusa das Cachoeiras.
— Tudo bem, mas o que aconteceu depois que ela apareceu?
— As portas da cela onde eu estava detida inexplicavelmente se abriram, os dois guardas que deveriam vigiá-la estavam dormindo e eu sai da cela e vim caminhando até aqui onde acabei por te encontrar.
— Mas e sua filha? Você fez uma prece a Deus se comprometendo a encontrá-la onde quer que estivesse, você não acha isso uma grande loucura?
— Não. Apenas penso que se fosse loucura a enviada da Divindade que eu cultuo não teria me libertado da prisão.
— Nisto você até tem razão, mas como você fará para encontrá-la?
— Não tenho a mínima idéia, mas Deus irá me guiar.
— Mas e esta Divindade que você cultua? Ela existe mesmo? Você a viu de verdade?
— Claro! Inclusive tem até uma parte de minha história que eu esqueci de lhe contar que é a seguinte: na noite que precedeu o nascimento de minha filha eu tive um sonho simbólico onde esta mesma dama que irradia intensamente uma claridade na cor rosa me pedia que marcasse o braço direito de minha filha, como era costume em minha aldeia, com o símbolo de minha descendência.
— E você, o que fez?
— Fiz o que a Divindade determinara a mim.
— O que? Você marcou a sua própria filha?
— Sim, mas foi com um símbolo pequenino e......
Manuela recusou-se a continuar ouvindo aquela história que não lhe parecia ter nem pé e nem cabeça e levantou-se do tronco onde estava sentada, entretanto, ao se levantar, deixou a mostra parte de seu braço direito que a lua cheia iluminou com tanta claridade que a prostituta não teve como refrear um grito de emoção e passou a tremer as mãos e a boca com uma emoção tão intensa que mal conseguia balbuciar corretamente as palavras:
— M-a-n- uela.... é v-ocê!!!!
— O que?
Procurando fazer um enorme esforço para conter a emoção, a prostituta também se levantou do tronco onde estava assentada e, procurando mostrar o braço direito na altura dos cotovelos, de um só fôlego disse à Manuela:
— Veja esta marca em meu braço!
Manuela olhou atenciosamente e também começou a tremer com emoção incontida ao perceber que aquela marca era idêntica a sua.
A prostituta, então, percebendo os efeitos de seu gesto na emoção de Manuela, procurou retomar o diálogo:
— Manuela, o meu nome é Indaiara e eu sou a sua mãe.
E, ao ouvir esta confissão, Manuela percebeu que ainda havia pelos menos mais um motivo para viver porque ainda havia mais uma pessoa para amar e, num frenesi emocional incontido correu de braços abertos ao encontro de Indaiara a lhe dizer:
— Mamãe! Mamãe! Minha Mãe, eu te amo!!!
— Eu também te amo minha filha, me perdoe!!!!
— Não há nada a perdoar minha mãe, nada!!!!
Após alguns minutos de intensa emotividade Manuela foi utilizando a sua extrema capacidade de raciocínio e disse a Indaiara:
— Mãe, meu Deus como é bom conhece-la finalmente!!!
— Também tenho esta mesma sensação minha filha, mas agora procure serenar as emoções e me diga tudo o que tenha para me dizer!
— Tudo bem! É o seguinte: temos que sair do país o mais rápido possível: você para não ser recapturada pelas autoridades e eu para não ser encontrada pelos homens que me violentaram.
— É verdade, mas como faremos isto?
— Sei onde meu pai guardava algumas barras de ouro e sei que apenas uma delas é plenamente suficiente para voltarmos para sua terra natal.
— Mas você faria isso? Abandonaria toda sua cultura e civilização para ir viver comigo?
— Claro! É como lhe disse mãe, nada mais me prende nesta terra onde, como já disse anteriormente, corro até mesmo risco de vida. Para falar a verdade, minha mãe, Deus e esta Divindade das Cachoeiras devem mesmo fazer questão que fiquemos juntas!
— Por que você diz isto?
— Você porque ao meu lado estará sempre próxima de parte deste amor que tanto procurou na vida e eu porque ao seu lado terei sempre um motivo a mais para viver.
— Que coisa mais linda Manuela!!!!
E as duas continuaram conversando e matando a saudade durante os sete meses que durou a viagem de volta à terra natal de Indaiara.
Assim que retornaram de volta a aldeia alguns de seus irmãos e irmãs não as receberam com bons olhos devido ao desgosto e tristeza tão intensos que ela provocara em seu pai com sua partida repentina causando, na interpretação destes, a morte dele.
Mas não há feridas que o tempo não cicatrize e é assim que vamos ver doze anos após o retorno de Indaiara, juntamente com a filha, para sua terra natal, a convivência plenamente harmoniosa entre todos os membros da aldeia.
Indaiara ensinara a Manuela todos os segredos no trato com as ervas e ela aprendera com tanto afinco que se tornou a sucessora natural de sua mãe na aldeia.
E é assim que vamos encontrar, cinco anos após todos estes eventos, Indaiara cozinhando o almoço ao mesmo tempo em que lágrimas gotejavam de seus olhos.
É importante que se diga que eram lágrimas provenientes da mais pura alegria por finalmente ter encontrado o amor na figura representativa de sua filha Manuela.
E foi no exato instante em que pensava desta forma que Indaiara viu mais uma vez a figura da enviada da Divindade das cachoeiras. Ela estava a lhe dizer que seus pensamentos estavam equivocados e que o verdadeiro amor, na realidade, estava dentro de um rio que distava dois quilômetros de onde ela estava.
Com intensa curiosidade, Indaiara caminhou a passos céleres em direção ao rio indicado. Quando se aproximou das margens do rio a enviada da Divindade das cachoeiras apareceu aos olhos de Indaiara pela última vez naquela sua encarnação e lhe disse:
— Olhe para dentro do rio e veja o amor que você tanto buscou em sua vida!
Indaiara olhou, olhou e olhou, mas a única coisa que via no rio era o reflexo de sua própria imagem.
Passado alguns instantes a enviada da Deusa das cachoeiras perguntou a Indaiara:
— E então, o que você viu?
— Sinceramente, eu só vi o reflexo de minha própria imagem.
— Então você realmente encontrou o amor!
— Como é?
— Isto mesmo que você acabou de ouvir: você acabou de encontrar aquilo que foi tão longe buscar, mas que estava aqui mesmo e onde quer que você fosse!
— Ainda não entendi.
— Você viu a sua imagem refletida na água e eu lhe disse que ela representa a resposta na sua busca pelo amor porque, na realidade, o amor está dentro de você mesmo.
— Que amor?
— O amor Divino ou você não sabia que todo ser humano é um templo vivo de Deus?
— Não, eu não sabia!
— Então nunca se esqueça de que qualquer ser humano, se não procurar descobrir e desenvolver a essência do amor Divino que carrega dentro de si, jamais virá a encontrá-lo exteriormente.
— Concordo certamente com a senhora, mas eu descobri o amor que tanto procurava na figura de minha filha.
— Engano seu, você só descobriu este amor por sua filha quando procurou encontrar a essência do amor Divino que habita dentro de ti através da realização diária de preces e do desenvolvimento da habilidade de praticar a caridade por meio do uso de ervas. Estou falando alguma mentira?
— Não. Então quer dizer que a minha Manuela não representa para mim a figura do amor?
— Não. Sua filha certamente representa para você a figura do amor, mas você só conseguiu encontrar o amor através desta representação quando buscou desenvolver o amor Divino através da caridade, está entendendo?
— Sim. Agora tudo clareou.
— Busque primeiramente a Deus e as virtudes que desenvolvem o amor Divino, pois somente assim outras coisas vos poderão ser agregadas, como por exemplo, o amor na forma de um filho, um homem, uma profissão, etc. Entendido?
— Sim senhora.
Dizem que Indaiara ficou extremamente feliz com a descoberta do local onde se encontra o amor: dentro de seu coração!!!
Indaiara também descobriu que, como desconfiara, a dama de coloração rósea era, de fato, uma enviada posicionada à direita da Divina Deusa das Cachoeiras.
Atualmente Indaiara também está a servir esta Divindade, à esquerda, como Senhora Pomba-gira Indaiara, sim, uma pomba-gira ligada à Deusa das Cachoeiras, mas atuando sob a irradiação da Deusa do Mar Sagrado, ou seja, uma pomba-gira cuja uma das atribuições é estimular a geração de sentimentos amorosos que, se vivenciados, podem aproximar os seres de suas essências Divinas e de Deus, o que significa dizer, uma Pomba-gira da Vida.
Manuela, atualmente, também serve a Divindade das Cachoeiras só que pela direita, trabalhando como uma preta-velha que não devo revelar o nome, mas que posso dizer que é um fato bastante conhecido um de seus pontos cantados revelar que ela “tem o segredo da lua”.
Quanto a mim, que estou a lhes narrar esta história, pouco importa a revelação de meu nome. Só o que posso e devo revelar é o fato de que, se você se encontra perdida e desesperada, querendo encontrar um amor, clame por nosso auxílio, pela ajuda das guardiãs do amor fatoradas à vida porque, de acordo com seus merecimentos, poderemos estimulá-la a encontrar o verdadeiro amor, que é o amor pelas obras e virtudes que possam levá-las na direção Daquele que é dono e criador de todo o amor: O Divino Pai Olorum!
Somente por meio da vivência e prática deste Seu amor é que vocês poderão ter a possibilidade de verem agregados aos seus merecimentos outros tipos de amores e desfrutarem deles com plenitude.
Que Ele os abençoe e possa agregar em suas vidas, além do amor, divinos sentimentos que também podem levá-las até ele: justiça, lei, conhecimento, fé, evolução e vida.



Saravá ao amor que habita o íntimo de toda mulher!!!!!!
Saravá à essência feminina que existe dentro de cada homem!!!!!!
Saravá à energia do amor!!!!!!
Saravá à todas as pomba-giras!!!!!!
Saravá à todas as pomba-giras do Amor e da Vida!!!!!!!!!





Ass: Sra Bombogira Sete Rosas