sábado, 2 de fevereiro de 2013

Sr Exu e a fé






− Desculpe-me irmão, mas ainda não consegui entender a questão relacionada à fé que você vem tentando esclarecer para mim!
− Acompanhe-me!
E, levando-o pelo braço, transportou-o até o interior de uma gruta absolutamente escura, perguntando-o:
− Onde estamos?
− Parece uma gruta.
− Aqui está claro ou escuro?
− Mas a resposta é obvia!
− Ela está clara ou escura!
− Escura. Totalmente escura!
− Então, você está dizendo para mim que aqui dentro só existe escuridão?
− Aos meus olhos sim!
− E aos seus sentimentos?
− Como?
− Tuas sensações companheiro! Você sente que este local está escuro?
− Não sei!
− Onde estamos existe água?
− Sim! Não posso ver, mas escuto o gotejar de gotas de água numa espécie de lago.
− Onde estamos existe morcegos?
− Pelo leve odor de guano acredito que sim.
− Nós dois estamos sozinhos neste local?
− Não! Sinto a presença de dois seres guardando a entrada da gruta.
− O que mais você consegue sentir?
− Sinto que dentro do lago existe a presença de seres femininos.
− Muito bem agora abra os seus olhos!
− Como você sabe que eles estão fechados?
− Abra-os companheiro!
Ele abriu os olhos e a caverna iluminou-se por completo.
− Como isto pode ser possível?
− E agora companheiro? Esta gruta está clara ou escura?
− Está clara!
− Tem certeza?
− Certamente! Posso até mesmo enxergar o lago que lhe falei antes!
− E os seres femininos?
− Não consigo vê-los ali dentro, mas sinto que continuam no mesmo local.
− E os guardiões da gruta?
− A mesma coisa!
− Então, você está vendo ou não está vendo? Esta gruta está clara ou escura? Ah!ah!ah!ah!ah!ah!ah!ah!ah!ah!ah!ah!ah!
Aquela risada arrepiou-lhe até a alma.
−Responda-me companheiro! A caverna está clara ou totalmente escura?
− Sinceramente? Não sei de mais nada!
− Mas isto é bom cabra! Desconstruir falsas certezas, transmutar vãs sabedorias: tudo isto é muito bom! Mas, então devo perguntar: esta gruta não lhe parece simultaneamente clara e escura?
− Penso que sim, pois antes na aparente escuridão eu conseguia sentir os seres femininos e os guardiões de tal forma que, praticamente, eu poderia dizer que conseguia enxergá-los, mas agora neste clarão eu não os vejo mais!
− Neste clarão o que você consegue ver?
Ele fechou os olhos por alguns instantes, depois os abriu e disse:
− Existem três espíritos de luz aqui dentro e que antes, na escuridão, não conseguia ver. 
− Nesta claridade companheiro, aqui neste campo de forças da natureza, você consegue enxergar os espíritos divinos da criação que trabalham na luz.
− Sei.
− Na escuridão, por sua vez o que você conseguiu ver são espíritos divinos da criação que trabalham nas trevas. Luz e trevas, cabra, são as duas faces do Criador; não há monte mais alto ou vale mais profundo que possa escapar da Sua santa presença.
− Este aqui é um ponto de força natural que serve como campo de atuação para os seres da esquerda, não é isto?
− Sim, e por isto na escuridão você pôde observar mais riquezas de detalhes neste espaço.
− Compreendo!
−Quando a noite chega o sol não desaparece do orbe terrestre: ele está no firmamento celeste apenas cedendo sua vez para que a lua e as estrelas também venham a brilhar. No amanhecer do dia a lua e as estrelas também não desaparecem, apenas cedem o seu brilho para o reinar do sol.
− Agora entendo o que diz, mas o que isto tem a ver com a questão da fé?
− Tudo companheiro! Dentro de você, também criatura divina, existe luz e trevas! Fé é deixar sua luz clarear as trevas, mas também é entender  que suas trevas também são instrumento para que possas alcançar a luz.
− Sei.
− Deus é único, mas o ser humano é dual, e se dentro do ser humano há luz e treva é porque o Divino Criador considerou tal condição como a mais adequada para a evolução espiritual de suas criaturas.
− Entendo.
 Assim, um ser humano não deve julgar a treva de outro ser humano por que dentro do “juiz” também há treva. Da mesma forma, um ser humano não deve julgar a sua luz própria como mais luminosa, por que dentro de seus irmãos de jornada também existe esta mesma luz divina. Esta luz é única a cada criatura, mas também indiferenciada.
− Fé, cabra, é saber que dentro de tu há luz e trevas, mas que tanto na treva quanto na luz há a presença de Deus! Sendo assim, cabra, fé é querer ser “apenas” mais um! Fazer brilhar vossa luz divina e combater tua escuridão interior não lhe torna melhor do que ninguém, pois tal é o dever da criatura humana.
− Compreendo.
− Mas fazê-lo e, de forma altruísta, auxiliar teus irmãos mais necessitados a fazerem brilhar a luz divina afugentando as trevas das drogas, do ódio, da indiferença, do preconceito, da injustiça, do egoísmo, do orgulho e do desamor, isto sim é ser umbandista! É ter consciência da qualidade e não da quantidade!
− Sei.
− As almas que você auxiliar a brilhar, trarão brilho a sua: o brilho do merecimento.
− Entendo.
− A fé também é isto companheiro: acreditar no “nós” tanto quanto no “eu”!
− Entendo.
− Você veio até mim querendo saber quais procedimentos deveria realizar para, aos olhos de Deus, ser um autêntico umbandista filho de fé!
− É verdade! Foi isto mesmo!
− Acontece que só o saber não leva a nada se não houver a prática, e é isto que espero de ti: pratique com disciplina militar! Pratique, pratique e pratique! Queira sempre ser “apenas” mais um, mas com humildade e abnegação, busque fazer a diferença na vida dos mais necessitados e, assim, faça brilhar a vossa luz; por que Umbanda, cabra, é ser um na banda: Umbanda!!
− Entendas que tu não és melhor do que ninguém, mas não esqueças que ninguém também lhe é superior. Quantidade somente em números é só quantidade, mas quantidade em amor é caridade. Não te assoberbes da tua luz ou cairás na escuridão, mas não te envergonhes de tua escuridão para que venhas a alcançar a luz. Não seja sempre você mesmo por que tu não te bastas e porque a mesmice é o lodo da ignorância.
− Transmutação companheiro: transmute teu medo e alcance a fé, mas a vivencie e pratique para que sejas sempre um filho de fé.
− Que assim seja sr. exu!!!

Mensagem do Sr. Exu do Lodo.